São Paulo, terça-feira, 15 de julho de 2008

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JOSÉ ROBERTO TORERO

O homem que matou sua fome


Seu Pedro fez o que todos nós, peladeiros, sonhamos: montou um time de futebol e investiu no prazer de jogar


SE TEM um cara de quem eu tenho inveja no futebol é Pedro Ribeiro de Lima, um meio-campista atarracado, um tanto gordinho, e que vai fazer 60 anos nos próximos dias.
Seu Pedro fez o que todos nós, peladeiros, sonhamos: montou um time de futebol. Mas ele não quer ficar rico com a venda de jogadores para o exterior. Ele quer é jogar bola.
Morador de Campina Grande, seu Pedro tem uma modesta fábrica de sordas, espécie de pão-de-mel feito com rapadura e trigo, apelidado de "mata-fome". Uns 15 anos atrás, seu Pedro chamou funcionários de sua fábrica e formou um time amador.
Ele, é claro, seria titular absoluto.
Nesta época, mudou o requisito principal para quem quisesse trabalhar na fábrica. Não interessavam mais assiduidade e experiência. O importante era jogar bem. O time, que ganhou o nome da fábrica, Perilima (de Pedro Ribeiro de Lima), começou a vencer. Seu Pedro se empolgou e, em 97, registrou o time como profissional. "Esse negócio de futebol, não sabe?, eu entrei por diversão, mas acabei pegando gosto."
O Perilima começou a participar da segunda divisão da Paraíba. Para que o time pudesse evoluir, seu Pedro tirava duas horas do trabalho dos funcionários para que treinassem. E pagava um trocado por fora.
O técnico era sempre um jogador das antigas. Mas não tinha muito poder. "No começo, o técnico podia me trocar por outro, mas isso me deixava meio chateado, porque eu fazia uma luta grande pelo time, e ele me tirava no melhor da partida.
Daí, combinei dele me deixar à vontade. Saio quando quero."
A equipe não tinha grandes luxos.
Ia para os jogos na Kombi da fábrica.
Mesmo assim, conseguiu subir para a primeira divisão. Mas voltou para a segunda. E, depois, subiu e desceu novamente. Ficou nesse sobe-e-desce nos últimos dez anos. Porém seu Pedro diz que ele só subiu.
"Dez anos atrás, eu estava mais velho que hoje. É que eu comecei a fazer alongamento e essas coisas.
Decidi ficar mais bem condicionado para não fazer tanta raiva aos outros jogadores", diz o quase sexagenário.
Um grupo de universitários até simpatizou com o clube e montou uma torcida organizada, os "Sordados". No ano passado, eles vibraram quando seu Pedro fez seu primeiro e único gol na carreira: "De pênalti, que nem o gol mil do Romário".
Mas ter um time de futebol não é barato. "Nunca me preocupei em botar na ponta do lápis. Ia tirando do caixa da empresa o que precisava".
Após esforço matemático, conclui que cada torneio saía por uns 40 mil.
A fábrica começou a correr risco de falir. Seu Pedro teve que cortar gastos, e o time caiu de rendimento.
Neste ano, ficaram em sexto lugar na segunda divisão. E só havia seis clubes. Seu Pedro põe a culpa nos jogadores: "O pessoal não se concentra, não deixa de ir ao forró...".
Em 2009, sem dinheiro nem patrocínio, é bem provável que o Perilima não mais exista. Seu Pedro tem dívidas, e a federação não paga o que lhe deve. Mas ele não desanima:
"Nasci lá no mato e minha mãe morreu no parto. Nem tenho um retratinho dela. Fiquei no mundo sem mãe e tive uma infância sofrida, então isso para mim é café pequeno". E já pensou numa solução: "Neste ano, vou jogar na loteria toda semana".

torero@uol.com.br


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