São Paulo, quinta-feira, 16 de abril de 2009

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JUCA KFOURI

Ronaldinho, o outro

Enquanto o Fenômeno, por bem ou por mal, está pelas manchetes, o Gaúcho vai desaparecendo lentamente

RONALDINHO GAÚCHO em 2004 e 2005, quando eleito o melhor jogador do mundo pela Fifa, era, segundo José Miguel Wisnik, uma verdadeira antologia do futebol brasileiro.
"Ela dava o chapéu do Pelé, o toque do Romário, o calcanhar do Sócrates, a folha seca do Didi, as pedaladas do Robinho, o passe em concha do Ademir da Guia, enfim, era uma síntese de uma porção de craques", afirma o autor do brilhante, invejável e invejado "Remédio Veneno - O Futebol e o Brasil", livro editado pela Companhia das Letras, sucesso de público e crítica. Exagero do professor, ensaísta, músico e compositor, além de santista moldado pela areia das praias dos que viram Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe?
Não. Em 2004/2005, de fato, Ronaldinho Gaúcho era tudo isso. A ponto de outro mestre, Tostão, admitir a hipótese de vê-lo, na Copa do Mundo que se aproximava, no nível de Pelé, de Mané Garrincha, de Diego Maradona. E talvez ninguém como Tostão para poder dizê-lo, não só porque jogou com Pelé e Mané como porque, ainda por cima, vê futebol e escreve sobre futebol de modo a despertar os mesmos sentimentos que Wisnik causa com seu já clássico "Remédio Veneno". E, se Tostão ousou na previsão que não se concretizou, porque a bola é impiedosa com quem a trata com soberba ou se imagina mais importante do que ela, diagnosticou, também com a precisão de doutor versado nas coisas da mente, o luto que se abateu sobre Ronaldinho desde a malfadada Copa da Alemanha, quase três anos atrás. Ronaldinho não digeriu até hoje aquela perda e não entendeu por que tudo escapou por seus dedos.
Ele não deve nem mesmo saber quando foi que começou a jogar mais para os cinegrafistas e fotógrafos do que para seu time. Aqueles mesmo olhos incapazes de fitar o interlocutor numa simples conversa, mas que olhavam para um lado enquanto ele metia a bola no outro, perderam a naturalidade. E o que era gracioso, surpreendente e imarcável, passou a ser previsível, forçado e comum. O que foi sem que ninguém explicasse como era, deixou de ser, do mesmo modo, sem que houvesse uma explicação para o vazio.
Vazio que deve inundar a alma do craque -há tão pouco tempo a apenas um degrau da imortalidade, mas hoje, ao cair das alturas, transformado só em mais um, miseravelmente descartável.

O príncipe partido
Rogério Ceni estava em campo, mas, às vezes, parecia não estar. E, por isso, falhava como não costumava falhar. O que o desconcentrava só ele saberá, se quiser, dizer. Mas, fosse o que fosse, era demasiado para sua cabeça suportar. E o corpo pediu socorro. "Você precisa descansar", avisou. E eis que Rogério Ceni vive agora seu exílio.
O herói se retira, temporariamente. Tempo de se recuperar, tempo para pensar. Deixa órfã uma legião de fãs, além de um bando de gente sã que torce por sua rápida recuperação. São insondáveis os mistérios da mente, como os do coração.
blogdojuca@uol.com.br


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