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FUTEBOL
Viva a diferença
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
A reportagem de Sérgio
Dávila sobre o relatório da
ONU "Globalização e escolha cultural", publicada ontem na Folha, confirma o que já se podia observar a olho nu: no bojo da hegemonia cultural norte-americana,
ocorre uma uniformização do
gosto e dos hábitos (sobretudo de
consumo) em todo o mundo globalizado.
E o que isso tem a ver com futebol? Para quem, como eu, vê esse
esporte de massa como uma manifestação cultural, tem absolutamente tudo a ver.
No futebol, com raras exceções,
também tem imperado a mesmice. Os times jogam, ou tentam jogar, de um jeito parecido, os atletas tendem a fazer as jogadas
mais previsíveis, os técnicos preparam as estratégias mais convencionais. Nivelamento por baixo, sim, por mais que a expressão
pareça antipática ou saudosista.
Claro que continuam a existir
os craques, os jogadores de exceção, os "diferenciados", para usar
a expressão corrente.
E são eles que mantêm o futebol
vivo. São eles a única esperança
de que não prevaleça o pragmatismo aborrecido de equipes como
o Once Caldas ou a seleção grega.
Chega de demagogia: se esse é o
futebol do futuro, estou fora.
Vou ao estádio, ou sintonizo a
TV, para ver aquilo que estimula
a minha imaginação e amplia a
minha sensibilidade. E isso só é
possível com os times taticamente
ousados e, especialmente, com os
jogadores com estilo próprio,
avessos ao figurino dominante.
Às vezes, um único lance de talento e clarividência nos dá alento
para suportar horas sem fim de
futebol medíocre e medroso.
Na seleção B do Brasil que disputa a Copa América, esses lances
têm sido raros. Cito dois: o lançamento à la Gérson que Alex deu
para Adriano marcar o primeiro
gol contra a Costa Rica e o golaço
que Luis Fabiano fez contra o Paraguai. O resto foi de uma aridez
deprimente, apenas parcialmente
justificada pela necessidade de
testar jogadores e adquirir entrosamento aos poucos.
Já que estamos falando em estilo e em diferença, não vejo sentido, por exemplo, na utilização de
um atleta como Gustavo Nery para fazer de modo muito piorado o
que Roberto Carlos faz na seleção
A. Seria muito mais produtivo, a
meu ver, experimentar por ali um
lateral ou ala de outro estilo, como o santista Léo, o cruzeirense
Leandro ou o palmeirense Lúcio,
atletas mais leves, habilidosos, capazes de driblar e tabelar, e não
apenas de jogar a bola para a
frente, correr, trombar com o rival
e desferir petardos sem direção.
Claro que, como já escrevi, Parreira tem sua filosofia de trabalho, assentada sobre uma frieza e
uma paciência estranhas ao nosso
modo mais passional de ver o jogo. Às vezes essa estratégia é coroada com o êxito.
Mas um pouco de invenção e
ousadia é vital. Para que a arte do
futebol não morra. Para que o futebol não ajude a TV idiotizada, o
cinemão americano e a indústria
radiofonográfica do jabá a embotar nossa sensibilidade e a nos tornar consumidores do sempre
igual.
Briga indesejável
Num contexto futebolístico em
que rareiam os atletas capazes
de organizar o jogo com talento
e lucidez, é lamentável o atrito
entre o técnico Estevam Soares,
do Palmeiras, e o meia Pedrinho. Sem o jogador, o alviverde
torna-se um time comum, sem
padrão, que joga na base do
bumba-meu-boi. Pode até vencer, mas sem brilho. Para o bem
do Palmeiras, tomara que os
dois se entendam.
Santos nas alturas
Não era difícil prever que o
Santos chegaria ao topo da tabela. O surpreendente foi a rapidez com que isso aconteceu.
A fulminante arrancada santista só deixa no ar um receio: o de
que o time de Luxemburgo
atinja o ápice antes da hora, que
"vire o fio", entrando em declínio na reta final.
E-mail jgcouto@uol.com.br
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