São Paulo, sexta-feira, 17 de outubro de 2008

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XICO SÁ

Sexo, mentiras e videoteipe


Dedadas e caneladas à parte, STJD ameaça Grêmio na luta pelo título tomando como base um falso moralismo

AMIGO TORCEDOR , amigo secador, se você acredita que futebol é coisa de macho, como reza a tradição latina, precisa rever o seu fundamentalismo ludopédico.
Mire-se no exemplo da última sessão do seriíssimo Superior Tribunal de Justiça Desportiva, o austero STJD, espécie de suprema corte das peladas. Foi bonito ver os austeros senhores julgando boleiro por uma simples passada de mão na bunda do rival, o que se constitui, segundo os ilustríssimos, atitude contrária à disciplina e à moral desportiva.
Se bem que não foi uma passada de mão qualquer, a câmera exibe o justo momento em que o jogador atinge com o dedo conhecido como "fura-bolo" (ou terá sido o "maior de todos"?) a retaguarda inimiga.
Como se o ato vulgar e comezinho, traço marcante e definidor da cordialidade nacional, fosse capaz de, por si só, comprometer o imaculado futebol pentacampeão do mundo.
O menino foi abusado, não é qualquer destemida criatura que tem a audácia de acarinhar o latifúndio dorsal de um zagueiro. Ainda mais um bravo defensor do Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense. E não em qualquer várzea. Em pleno Olímpico.
Assim o fez o atrevido Carlos Alberto, do Botafogo, em chacota digna dos melhores tempos de Didi Mocó, anti-heroísmo lúdico à moda de João Grilo ou Pedro Malasartes.
A dedada, como se diz no populacho, custou muito ao capeta: oito jogos de fora. A vítima foi o Réver, que pegou três partidas pela humaníssima reação ao ato de cunho desmoralizante. Ora, meritíssimos, queriam que o rapaz deixasse quieto? A agressão agora muda de clube e de lado. Morales, do Grêmio, foi condenado pelos juízes do videoteipe.
Crime: atingiu o órgão genital reprodutor de Alessandro. Castigo: jejum de oito jogos. Atentem para um detalhe: o uruguaio calça chuteiras número 46. Será que doeu, amigo? No momento da falta, aquelas arrepiadas que começam nas canelas e atingem toda a anatomia do sujeito, o juiz aplicou cartão amarelo. Os deuses de casaca do STJD, porém, foram severos. Mas, pelo que se sabe, o órgão do atingido não sofreu danos que pudessem comprometer a bíblica multiplicação da espécie.
O polêmico julgamento que pode limar o Grêmio da disputa do Brasileirão, caso os recursos que ontem liberaram todo mundo tomem o mesmo rumo, fez Marcelo Ferla, autor de sagas tricolores, tirar a faca da bota, mas com o bom humor de sempre. Ele sugere que a CBF elimine a triste figura do juiz dos estádios.
Para que o senhor de preto (às vezes de amarelo) se a turma do videoteipe é quem decide o destino dos torneios? "Imagina que beleza o jogo sem juiz: o sujeito paga ingresso e vibra com os gols de seu time, as expulsões do adversário, as defesas do goleiro.
Mas os três pontos não estão garantidos! Aí na quarta da outra semana, o cara junta amigos e a TV transmite ao vivo o julgamento. Além de vender dois pay-per-views, o do jogo e o da sessão, todo mundo vai ver por que o perdedor pode ter o resultado revertido! É muita emoção, real, virtual... e no tribunal!", arremata.
Faz todo sentido. Ora, se o videoteipe é capaz de decidir campeonatos, para que a triste figura de preto? Eu sigo com o tio Nelson e acrescento: além de burro, o videoteipe é um baita de um falso moralista.

xico.folha@uol.com.br



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