São Paulo, quarta, 18 de fevereiro de 1998

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Sempre é tempo de mudar o dono do banco

ALBERTO HELENA JR.
da Equipe de Articulistas

Engana-se quem julga que a conquista do México, em 70, não teve o dedo de Zagallo, simples herdeiro do time de Saldanha. Teve, sim, e decisivo. Até mesmo a contragosto de Zagallo, forçado pela imprensa a escalar determinados jogadores que não eram de seu apreço. Este foi o caso de Tostão como centroavante. Assim como o de Rivellino (Zagallo preferia Paulo César para fazer a função de terceiro -ou já seria quarto?- homem de meio-campo). Isso para não falarmos em Clodoaldo (pasmem!), já que a preferência do técnico, ao assumir na bucha da Copa, chegou a chamar Carlos Roberto, um cabeça-de-área botafoguense da sua mais estreita confiança.
Mas Zagallo, como bem lembrou o Juca Kfouri ontem, improvisou Piazza de quarto-zagueiro e efetivou Everaldo na lateral-esquerda, no lugar de Marco Antônio.
O fato é que o time do tri não era o time das eliminatórias. Muito menos o da fase de preparação de Saldanha, que se embaralhou todo, tentando encaixar Dirceu Lopes e Zé Carlos, numa estrutura inconcebível à época.
Mas o mais significativo foi a alteração de ordem tática. Com Saldanha, jogávamos num já clássico 4-2-4. Com Zagallo, recaímos no 4-3-3 do bi. Isso se aceitarmos essa numerologia consagrada pelos experts, que se esquecem do recuo permanente de Pelé, o que resultaria em 4-3-3 de Saldanha e 4-4-2 de Feola a Zagallo.
Vou por aí, meio nas águas do Juca, para chegar onde quero: minha perplexidade diante perplexidade de Zagallo.
Quando assumiu a seleção do tri, o jovem treinador chegou com a receita pronta, as idéias definidas e os nomes escolhidos. Por força das circunstâncias, trocou os nomes para manter as idéias. Hoje, o veterano treinador vive trocando de idéias para manter os mesmos nomes.
Teve quatro anos para embicar esse time em direção ao tetra, dispondo de um elenco fulgurante à disposição. E, quando chega a hora de deslanchar, empaca na encruzilhada.
Por exemplo: nunca na história do nosso futebol tivemos tantos zagueiros de área de bom nível técnico e com tamanha experiência internacional como agora. Pois é ali, no miolo da zaga, que fazemos água por todos os lados. Raras foram as épocas em que pipocaram tantos talentos do meio-campo pra frente, e até agora Zagallo não resolveu um singular mas decisivo problema -o da meia-direita.
Abre o olho, velho Lobo, porque tem fera mais faminta rondando seu pedaço. Afinal, se não há mais tempo para fazer experiências no campo, sempre é tempo de mudar o dono do banco.
Como em 70.

Claro, Trajaninho, meu chapa, que o atleta do século tem todo o direito de emitir suas opiniões sobre a seleção. Pois se nós todos, eméritos cabeças-de-bagre, o temos, por que não o Rei?
Acontece que, como ministro da República, pode mas não deve. Sobretudo, menosprezar o futebol de outros países.
Disse aqui e repito: como comentarista de TV, licenciado do cargo de ministro, Pelé pode e deve dizer tudo o que quiser. Aí, resta-nos o inalienável direito de mudar de canal.


Alberto Helena Jr. escreve às quartas, domingos e segundas



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