São Paulo, quarta-feira, 18 de março de 2009

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TOSTÃO

Ser ou não ser craque


Para ser um craque, é preciso, além de muito talento, transpirar bastante pelo corpo e pela alma


COMENTARISTA esportivo não deveria ser ansioso, apressado, chamar uma promessa de craque, ser amigo de atletas, técnicos e dirigentes, entrar para a turma do oba-oba nem ser um refém da indústria do entretenimento, que quase só pensa em promover o espetáculo, aumentar a audiência e vender mais anúncios.
Por outro lado, comentarista não deveria, em situações especiais, ter medo de se encantar por um jogador no início da carreira.
Domingo foi um dia especial. Vi a primeira partida de Neymar, 17 anos, como titular do Santos. Fiquei empolgado, como fiquei quando vi pela primeira vez Zico, Ronaldo, Ronaldinho, Romário e outros. Já Kaká foi me encantando aos poucos.
Ao narrar o primeiro gol de Neymar como titular do Santos, contra o Mogi Mirim, Milton Leite, ótimo narrador do Sportv, disse que pode ter sido um gol histórico.
Para muitos, foi um exagero. Milton Leite, como eu, deve ter tido a sensação, não pelo gol, mas pela presença de Neymar em campo, de estar diante de um futuro fora de série, e não apenas de um excelente jogador.
O comentarista afirmou que Neymar não deveria tentar fazer de cada jogada um lance bonito. Não acho que ele quis fazer firulas nem ser diferente. Ele é diferente. Seus toques na bola são belos, eficientes e naturais. Ele não pode nem deve jogar como os outros. Acredito até que deu muitos passes para os lados, quando poderia tentar jogadas individuais.
Para ser um craque, o que ainda está longe de ser, Neymar, além de adquirir mais confiança e saber também seus limites, terá de aumentar sua massa muscular, aprender e aprimorar os fundamentos técnicos, ser ambicioso, no sentido de desejar ser sempre melhor, e ser um guerreiro.
Ser guerreiro não significa trombar nem guerrear com os adversários. Ser guerreiro é não se esconder do jogo, crescer nas adversidades e transpirar bastante pelo corpo e pela alma.
Vão começar as discussões se Neymar é um segundo atacante ou um meia ofensivo. Isso é irrelevante. Mais importante é o técnico definir se, quando o time perder a bola, ele vai recuar e participar da linha de marcação do meio-de-campo ou se vai ficar mais à frente e mais perto do gol.
Pelo pouco que vi (e não foi quase nada), Neymar deve se destacar mais pela criação de jogadas e pelos passes do que pelo número de gols. Para ser craque, terá de fazer bem as duas coisas, seja atacante ou meia.
Todos conhecemos histórias de grandes promessas que não se tornaram craques. Uma das razões apontadas para isso é o deslumbramento desses jovens pelos elogios e pela fama. Não acho que isso seja o mais importante. O principal motivo são os nossos erros de avaliação. Confundimos talento com habilidade e com técnica. O talento é a síntese, a união da criatividade, da habilidade, da técnica e das qualidades físicas e emocionais.
Vivemos em uma época de pressa, de exageros, do que parece, mas não é. Antes de jogar, Neymar já era uma estrela. Um grande exagero.
A expectativa é tanta que, se ele não for, no mínimo, igual a Robinho, será uma decepção. Tomara que ele drible tudo isso.


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