São Paulo, sábado, 18 de maio de 2002

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Amistoso da seleção alimenta desejo de autonomia em região espanhola

Cachê dobra, e Brasil volta a fazer jogo diplomático

FÁBIO VICTOR
JOSÉ ALBERTO BOMBIG
SÉRGIO RANGEL
ENVIADOS ESPECIAIS A BARCELONA

Espécie de embaixadora do futebol, a seleção usa hoje mais uma vez o seu poder diplomático. Só que, ao contrário de unir povos, o time brasileiro joga para alimentar o desejo de autonomia de uma região -a Catalunha em relação à Espanha, no caso.
Por US$ 700 mil, a CBF aceitou o convite para enfrentar hoje, às 16h (Brasília), em Barcelona, o selecionado catalão, que não é reconhecido pela Fifa nem pode fazer jogos oficiais. É quase duas vezes o que o Brasil levou para enfrentar a Arábia Saudita, em fevereiro. É, também, o cachê mais alto já pago pelos catalães a um rival, mas a entidade acredita que compensa.
E não são apenas eles que pensam assim. Nos últimos anos, principalmente depois que a CBF passou a ser presidida por Ricardo Teixeira, em 1989, a seleção serviu involuntariamente a causas nacionalistas pelo planeta.
A Espanha é o exemplo mais emblemático. Se o penúltimo jogo antes da Copa de 2002 será contra a Catalunha, antes do Mundial de 98 o adversário foi o Athletic Bilbao, maior equipe do País Basco, região espanhola que também busca autonomia.
Logo depois de empatar com o time basco, o Brasil enfrentou Andorra, principado encravado entre Espanha e França e controlado por esses dois países até 93, quando obteve sua independência.
Ainda em terras espanholas, o Brasil reforçou sentimentos contrários a Madri num amistoso contra o Valencia em 1995. Embora não com a mesma força de Catalunha, País Basco e Galícia, a região tem dialeto próprio e pleiteia sua autonomia. Os galegos também viram o Brasil, em 99, mas o amistoso foi contra o "poder central", a seleção da Espanha.
A seleção já protagonizou amistosos contra regiões do Leste Europeu, como Eslováquia e Bósnia, e contra as repúblicas bálticas da antiga União Soviética -todos adversários que estavam em processo de emancipação.
No caso da Catalunha, a possibilidade de separação da Espanha é quase nula, mas as conquistas cresceram gradativamente nos últimos 24 anos -quando a região ganhou o reconhecimento de autonomia especial, com identidade nacional própria, algo que só outras duas da Espanha possuem (País Basco e Galícia), apesar de outras também reivindicarem.
"Não pedimos para sair da Espanha. Desejamos competência própria em matérias como justiça e representação na União Européia e mais poderes políticos. No terreno simbólico, as nossas seleções esportivas têm uma importância fundamental. Jogar com o Brasil, uma potência do futebol, só fortalece os nossos símbolos", disse à Folha o primeiro conselheiro (espécie de primeiro-ministro) da Catalunha, Artur Mas.
Ontem, o político recepcionou, e até bateu bola, com uma pequena delegação brasileira -da qual faziam parte Ricardo Teixeira, Luiz Felipe Scolari e os jogadores Ronaldo e Emerson- no Palau de la Generalitat, sede da administração da Catalunha e voltou a ouvir a promessa de que a seleção fará sua primeira escala em Barcelona caso ganhe o pentacampeonato no Mundial Coréia/Japão.
Teixeira prometera só uma visita, mas ontem Scolari falou até num novo amistoso. Seria mais um agrado para uma região que se orgulha de falar uma língua diferente dos espanhóis de Madri.



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