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São Paulo, domingo, 18 de maio de 2003

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ANÁLISE

Fiasco é chance de redenção para Massarandubas

MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE

"Porrada! Porrada! Porrada!" A histeria tomava conta do Morumbi nos minutos finais da vitória do River. Inconformadas, as arquibancadas cobravam dos jogadores uma "atitude". Fabinho obedeceu. Caçou um argentino até levar o vermelho. O estádio teve a audácia de aplaudir. E o volante, a de agradecer, braços erguidos para o céu preto-e-branco.
O desfecho escandaloso da eliminação do Corinthians da Libertadores mostra que o torcedor paulistano aos poucos se transforma em um canalha.
A violência, que já havia ultrapassado a fronteira dos estádios, agora ameaça a essência do esporte. Festejar um pontapé qual um gol?
O corintiano, que simboliza a mais linda história de amor entre uma torcida e seu time de futebol, hoje prefere cantar: "Traz a farinha [cocaína] e a maconha. Corintiano, maloqueiro e sem-vergonha".
Envergonhados da herança "pó-de-arroz", os são-paulinos vibram com a nova identidade, forjada a socos. Agora gladiadores da periferia, não poupam nem o ídolo. "Kaká pipoca", manchetou, rude, o site da Independente logo após a desclassificação na Copa do Brasil.
Talvez não exista um clube que tema tanto o torcedor como o Palmeiras. Basta uma derrota para a sede redobrar a segurança. De pai para filho, o espírito palestrino, de comunhão e resistência cultural, aparentemente evaporou-se.
O fenômeno não se restringe ao âmbito das uniformizadas. Tampouco se explica pela superexposição do esporte na mídia eletrônica, pois, antes mesmo do advento da TV paga, São Paulo já derrubava a média de público dos Nacionais. Uma má vontade que se estende até à seleção brasileira -ao menos no papel, uma grande oportunidade de espetáculo.
A verdade é que, à medida que o futebol consagrava no país a fórmula baratinada do mata-mata, o paulistano perdia o humor, o prazer e, constata-se agora, o respeito pela bola.
Por isso, a desilusão copeira do "Trio de Ferro" nas últimas semanas pode servir a um saudável recomeço.
Restam a corintianos, são-paulinos e palmeirenses os longos meses do Brasileiro. Na Série A, por pontos corridos, toda partida, todo fim de semana e, em última instância, todo lance importam, têm valor.
É uma ótima chance (a única?) para o torcedor se reeducar. Deixar de lado a preguiça Massaranduba ("só-assisto-aos-melhores-momentos-e-só-vibro-quando-meu-time-ganha-um-título-ou-então-vou-dar-porrada") e, desarmado, retomar o gosto pela dinâmica, pela inteligência, pelo vigor do jogo de futebol.



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