UOL


São Paulo, sexta-feira, 18 de julho de 2003

Texto Anterior | Índice

FUTEBOL

Os técnicos: Aristóteles

JOSÉ ROBERTO TORERO
COLUNISTA DA FOLHA

Filosofastro leitor, peripatética leitora, talvez vocês nunca tenham ouvido falar em Aristóteles Brás. Um erro imperdoável! Aristóteles Brás é um dos mais famosos técnicos que já passaram pela gloriosa cidade de Torre de Pedra.
Conduzido à direção do Esportivo Torrense, seu primeiro ato foi reunir os jogadores em torno do campo para explicar sua filosofia de trabalho:
"Ganha o jogo aquele time que faz mais gols. Nós queremos ganhar os jogos. Logo, temos que fazer mais gols que o adversário".
Os jogadores olharam uns para os outros. Nunca haviam escutado uma preleção tão simples. Aquele treinador colocava suas idéias de um modo rigorosamente lógico, e aquela lógica lhes transmitia uma sensação de ordem, segurança e estabilidade.
Sim, Aristóteles era um mestre nos silogismos. E eles também faziam sucesso nas conversas individuais que o treinador tinha com os jogadores.
Querem exemplos? Eis um.
Certa vez o atacante Alexandrão estava deprimido por vir perdendo vários gols. Aristóteles chamou-o de lado no intervalo de um amistoso e afirmou o seguinte: "Atacantes fazem gols. Alexandrão é um atacante. Logo, Alexandrão fará gols".
Alexandrão arregalou os olhos, admirado diante daquela maneira tão cristalina de se enunciar uma verdade. Recuperou sua confiança e, voltando para o segundo tempo, marcou dois tentos, sendo um de letra e outro de bicicleta.
A mesma regra foi aplicada com o guarda-metas Felipe.
"Goleiros não podem tomar frangos. Felipe é um goleiro. Logo, Felipe não pode tomar frangos."
E com o grupo em geral.
"Times audaciosos ganham taças. Nosso time é um time audacioso. Logo, nosso time ganhará a Taça Castelo."
Verdade ou não, o fato é que a Taça Castelo testemunhou um histórico desempenho do Esportivo Torrense. O Bofete, primeiro adversário, foi surrado por 8 a 0. Por placares dilatados, também caíram o Cesário Lange, o Pardinho e o Porangaba. Na semifinal, contra o Real Sarapuí, outra goleada: 4 a 1.
A decisão foi disputada contra o Olimpique de Tatuí, time que fizera uma campanha marcada por empates e vitórias magras.
O povo de Torre de Pedra esperava outra goleada e lotou o estádio municipal. Porém, bem postado na defesa, o esquadrão tatuiano segurou o 0 e 0 e levou a partida para os pênaltis. Cada equipe acertou seus quatro primeiros chutes. Mas aí, na última série, Alexandrão acertou a trave, e Felipe engoliu um frango inacreditável.
Aristóteles era um lógico, mas o futebol não tem muito a ver com a lógica.
Nos vestiários, ele ainda teve de suportar uma derradeira humilhação. O presidente do clube subiu numa cadeira e, com o dedo em riste, bradou: "Técnicos que não ganham títulos são demitidos. O senhor não ganhou o título. Logo, está demitido".



Texto Anterior: Boxe - Eduardo Ohata: À procura de Tyson
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.