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ENTREVISTA JOSEP ACEBILLO
Rio está na moda, resta aproveitar
Arquiteto que planejou a mudança urbana gerada por Barcelona-92 diz que desafio olímpico carioca é maior
Pedro Carrilho/Folhapress
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Josep Acebillo, no Copacabana Palace, durante visita ao Rio
ITALO NOGUEIRA
DO RIO
A Olimpíada não resolve
sozinha os problemas urbanos sem que haja planejamento para os anos posteriores. Para que os altos gastos
não sejam malvistos pela população, pequenas intervenções ajudam a envolver o público na mudança provocada
pelos grandes projetos.
O diagnóstico é de quem
já passou, com sucesso, pela
preparação dos Jogos.
O arquiteto espanhol Josep Acebillo, 64, há 30 anos
planejando o crescimento
urbano de Barcelona -modelo de uso do evento para
melhoria na cidade-, considera o desafio do Rio, sede da
Olimpíada de 2016, maior do
que o da cidade espanhola.
"É uma cidade difícil de
conhecer. Tem uma grande
complexidade", diz Acebillo,
que foi diretor de planejamento urbano do Holding
Olímpico de Barcelona, responsável por planejamento e
execução de obras na cidade.
Ele defende uma "acupuntura urbana" para envolver a
população na transformação
da cidade. Por exemplo, foram construídas 150 pequenas praças antes de começarem as grandes obras para
a Olimpíada. "Todos os cidadãos viam uma nova Barcelona perto de sua casa".
Folha - Como era Barcelona
antes da Olimpíada de 92?
Josep Acebillo - No franquismo, Barcelona não gozou de muitos privilégios do
Estado Central. Era muito
próspera antes da ditadura, e
chegamos aos anos 80 no
fundo do poço. Com a transferência da indústria para
áreas de produção mais barata, tivemos que substituir a
economia industrial para
uma base de serviços.
Os Jogos Olímpicos chegaram
na hora certa à cidade?
Fizemos, antes, obras
de pequena escala muito rentáveis do ponto de vista político e social. Pode-se realizar
uma grande transformação
com pequenos projetos, uma
acupuntura urbanística.
Entre 1981 e 1988, nós fizemos cerca de 150 pequenas
praças. Todo cidadão via
uma nova Barcelona perto de
sua casa. Isso permitiu que
os Jogos fossem uma segunda fase, de projetos de mais
envergadura. Havia confiança de que as reformas se traduziriam em melhoras sociais. Muitas vezes, há dificuldade de demonstrar como
projetos grandes serão úteis.
Tendem a dizer: "Com esse
dinheiro poderíamos fazer
tantos hospitais, escolas".
Por que poucas cidades
servem de exemplo, como
Barcelona?
Fomos os primeiros que
deixaram de pensar os Jogos
como uma festa e inventamos a tese de que deveria
transformar a cidade. O projeto não era olímpico, era
completo. Sydney fez igual, e
Pequim também, em outra
dimensão. Atenas menos, e
Atlanta não serviu muito.
O que acha do Rio de Janeiro?
É uma cidade difícil de conhecer. Há uma relação inconcebível com o mar. Em
Barcelona, constantemente
se sabe onde está o mar. Fui
passear por Copacabana e vi
a praia. Atravessei duas ruas
[para dentro do bairro], a 50
m, 100 m da praia, e não se
vê, não se sente o mar.
Por que não será fácil para o
Rio usar a Olimpíada?
Quando lia sobre as inundações de abril [que mataram mais de 200 pessoas],
pensei: "Será a Olimpíada
capaz de evitar que aconteça
no futuro?". Eu imagino a
quantidade de áreas nesta situação [vulneráveis a deslizamentos], com a topografia
que a cidade tem hoje. Por
outro lado, é muito difícil
que o Rio tenha de novo um
compromisso de mudança
com prazo fixo. Uma cidade
com tantos problemas, por
onde vão começar?
O Rio terá um desafio maior
do que Barcelona?
Sim.
Quais dificuldades Barcelona
teve na preparação dos Jogos
Olímpicos de 1992?
A cada seis meses vinha a
o COI [Comitê Olímpico Internacional] para fiscalizar as
obras e diziam que estavam
atrasadas. No final, [as
obras] acabam. Tínhamos
dois comissários: um para
evitar atrasos e outro, eu, para que as obras não fossem
malfeitas. A questão não é
acabar, mas acabar com qualidade. Fizemos 50 km de galeria de serviços para colocar
de forma ordenada a luz, eletricidade. Depois de 15 anos
[dos Jogos Olímpicos], quando tivemos que fazer fibra ótica da cidade, foi muito fácil e
rápido porque tínhamos uma
galeria perfeita. Esse é um
dos grande legados da Olimpíada em Barcelona.
O projeto do Rio divide a cidade em quatro áreas distantes.
É uma boa solução?
Em Barcelona, dividimos
também em quatro áreas. Todas obedeciam a uma lógica.
Uma foi criada na década de
30 sem ter sido finalizada, e
queríamos urbanizá-la. Outra porque tinha instalações
esportivas isoladas [da cidade]. A terceira simplesmente
porque era a área mais pobre.
Na última, queríamos que a
cidade chegasse ao mar, que
era mais invisível do que no
Rio. Colocamos a Vila Olímpica numa área obsoleta e urbanizamos cinco quilômetros do litoral. Cada área tinha um objetivo muito claro.
O prefeito Eduardo Paes pediu ao COI a transferência de
algumas instalações para o
porto, mas a entidade vetou
parte dos pedidos.
É verdade que o COI não
gosta [de mudanças], mas
ninguém vai propor uma mudança para criar dificuldades. Deve prevalecer o projeto urbano.
O que fazer para que os Jogos
continuem rendendo após a
Olimpíada?
Colocamos muitos projetos [no BID olímpico] difíceis
de executar, que deliberadamente sabíamos que não
iriam acabar [antes da Olimpíada]. Todos começaram na
preparação dos Jogos, nas
áreas olímpicas. Temos que
pensar no "day after".
É possível mudar uma cidade
sem a Olimpíada?
Um projeto para a melhoria da cidade poderia ser feito
sem os Jogos, mas levaria dez
vezes mais de tempo. O Brasil
tem como calcanhar de aquiles a qualidade das cidades.
Se o país virar a quinta potência, as pessoas se conformarão em viver nas favelas que
vivem hoje? O problema urbano é federal. Os Jogos podem ser de eficiência tremenda. Nos anos 90, Barcelona
estava na moda. Agora vocês
estão. Resta aproveitar.
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