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Iatista não segue padrão, retarda troca de classe e busca hegemonia sem precedentes na laser
Maior que o barco e refém dele, Scheidt tenta o hepta
GUILHERME ROSEGUINI
DA REPORTAGEM LOCAL
O título brasileiro estava praticamente assegurado. Peter Tanscheidt velejava para manter sua
hegemonia na classe laser no país
quando um rapagão de 17 anos
tomou-lhe a frente e venceu uma
regata do campeonato de 1990.
"Naquele dia, vi que o cara era
de uma raça incrível. Acabei como campeão do torneio, mas tinha certeza de que ele seria um
grande atleta", conta Tanscheidt.
Pouco tempo depois, a profecia
se cumpriu. Ainda adolescente,
Robert Scheidt elegeu o pequeno
barco da laser como sua prioridade e ganhou destaque no cenário
internacional. Hoje, aos 30 anos,
inicia em Cádiz, na Espanha, a
campanha pelo sétimo título
mundial na categoria.
Nenhum brasileiro conseguiu
registrar uma longevidade tão
pronunciada no topo de uma modalidade olímpica. A marca impressiona até quem já sentiu o
gosto de subir no pódio em um
evento do mesmo naipe.
"Depois de um tempo na laser,
o atleta costuma buscar outros rumos, porque é uma classe que exige bastante da parte física. O Robert tem talento para ser bem-sucedido em outras provas de vela,
mas mantém a mesma força da
juventude. É inexplicável", diz
Tanscheidt, ele mesmo campeão
mundial na laser em 1991.
Inexplicável para os outros, mas
não para o próprio. Scheidt conta
que não existem segredos para
justificar suas performances.
"Sinto prazer em pegar o meu
barquinho e treinar", afirma o
atleta sobre a embarcação de 4 m.
Os amigos mais próximos, porém, vêem na influência da família e na possibilidade de dedicação
em tempo integral ao esporte as
causas que fizeram o iatista construir o currículo que hoje ostenta.
Na infância, o paulistano
Scheidt praticou tênis no Banespa
e no Pinheiros. Chegou à vela por
intermédio do pai, Fritz, um habitué do Yacht Club de Santo Amaro. A agremiação, que até 1938 era
batizada de Deutscher Segel-Club, congregava a colônia alemã
que se interessava por iatismo.
O técnico Dudu Melchert ensinou os primeiros passos na optmist, embarcação de 2 m para iniciantes. Aos 11 anos, Scheidt obteve o título sul-americano. Largou
o tênis e seguiu sua caminhada.
Competiu também com barcos
da snipe antes de ingressar de vez
na laser. Em 1990, os resultados na
categoria que defende até hoje começaram a aparecer.
Foi campeão brasileiro júnior e
decidiu se preparar para o Mundial que ocorreria no ano seguinte, na Escócia. Acabou abocanhando o título e, a partir daí, surgiu como candidato a um lugar na
seleção brasileira principal.
Nessa época, também, adquiriu
a única superstição na qual ainda
é apegado. Em todas as regatas
que disputa, leva para o mar uma
peça de xadrez, o cavalo. Diz que
o objeto traz boa ventura.
"Entrar na seleção significava
enfrentar o Peter, que era o melhor do mundo. Esse duelo foi
fundamental para a carreira do
Scheidt. Ele aprendeu muito",
conta Claudio Biekarck, um quase técnico do iatista -acompanha-o em grandes eventos.
Rumo inalterado
Tanscheidt e Scheidt de fato foram grandes rivais até a eliminatória dos Jogos de Atlanta-1996.
Do classificatório, apenas um sairia credenciado para o evento.
"Perdi a seletiva e encerrei a carreira. Sabíamos que quem ganhasse aquele torneio traria o ouro olímpico", recorda Tanscheidt.
Scheidt trouxe. E, com ele, pôs
fim à dúvida que o preocupava
naquela temporada. Formado em
administração pelo Mackenzie, titubeava entre seguir a carreira no
esporte ou exercer a profissão na
qual acabara de se graduar.
O ouro olímpico, contudo, virou incentivo e chamariz de patrocinadores. O caminho natural,
a partir dali, era encarar barcos
maiores e embates em outras classes. Só que Scheidt não mudou.
Em Sydney-2000, em uma disputa ponto a ponto com o inglês
Ben Ainslie, perdeu o bicampeonato olímpico. Após a última regata, chamou Biekarck para uma
conversa. Confessou, enfim, que
pensava em outra categoria.
"Ele mencionou que poderia
disputar a star. Expliquei que ele
ainda tinha uma ótima condição
física para brilhar na laser", contou Biekarck. Scheidt ouviu os
conselhos e seguiu competindo,
mas nunca abandonou o pensamento de encarar outros desafios.
"Quero mostrar meu valor em
outras classes. Depois de Atenas-2004, vou pensar melhor."
Uma mudança, porém, parece
não estar apenas no plano das
idéias do iatista. Há pelo menos
dois anos, ele adquiriu um barco
da star -possui dois metros a
mais de casco que o da laser e
comporta dois tripulantes. Com
ele, disputou torneios no Brasil,
mas não obteve bons resultados.
Seus críticos dizem que sua única virtude está no preparo físico e
que por isso o sucesso em outras
empreitadas dificilmente aparece.
Biekarck sabe de tudo, mas prefere não se intrometer. "Avisei
que, na star, ele vai enfrentar o
Torben Grael e o Marcelo Ferreira, atletas renomados e medalhistas olímpicos. Mas acho que não
adianta muito. O Robert sempre
surpreende a gente."
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