|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FUTEBOL
Obra patrocinada pelo governo revela, às vésperas da Copa, que a federação trabalhou para consolidar o 3º Reich
Seleção alemã abraçou regime nazista, afirma livro
GUILHERME ROSEGUINI
DA REPORTAGEM LOCAL
O futebol alemão apoiou com
entusiasmo a ascensão nazista e
emprestou o prestígio internacional de seus jogadores e dirigentes
para a consolidação do regime.
Mais: judeus foram banidos dos
gramados e executados sob os
auspícios da federação local.
Proposições que foram aventadas no passado ganharam respaldo de um documento histórico,
patrocinado pelas duas partes envolvidas -o governo e a entidade
que chefia o futebol do país.
O mea-culpa chega em forma de
livro e ganha destaque no momento em que a Alemanha dá os
passos finais para receber a Copa,
marcada para junho. "Futebol
sob a Suástica", nome da obra, esquadrinha como nasceu a simbiose entre o Terceiro Reich e o esporte mais popular do mundo.
"Entre 1933 e 1945, a federação
acatou todas as ordens recebidas
do regime e ocupou função de
destaque em sua propagação. É
importante ressaltarmos isso antes do Mundial de 2006, porque as
autoridades certamente serão
questionadas sobre esse tema no
ano que vem", afirma à Folha Nils
Havemann, historiador que assina as 473 páginas do calhamaço.
Sua explicação de como o namoro entre o nazismo e a federação ganhou fôlego demonstra os
interesses que já estavam envolvidos com o futebol. Segundo o pesquisador, não foi só a afeição
ideológica que levou os cartolas
ao partido de Adolf Hitler. A
questão mais importante, na verdade, derivava da economia.
"A Grande Depressão de 1929
atingiu em cheio a DFB [sigla da
entidade]. Em 1933, ela estava falida. Os nazistas surgiram como
esperança de ressurreição. Não
por acaso, o futebol colaborou
tanto para sua consolidação."
A bonança apareceu já em 1934.
Clubes como o Reichsbank, próximos da federação e dos nazistas, encheram os cofres após anos
de austeridade financeira.
Algumas personalidades, como
o treinador Sepp Herberger, também conseguiram impulsionar
suas carreiras ao não questionar
os valores pregados por Hitler.
Após o fracasso da seleção alemã na busca por medalhas na
Olimpíada de 1936, realizada em
Berlim, os cartolas elegeram Herberger para substituir Otto Nerz
no controle da equipe. O técnico
sempre negou envolvimento com
o regime, mas é questionado.
"Ele tinha uma vontade imensa
de manter seu posto no time nacional e fez o que foi preciso para
atender todos os desejos dos nazistas. Sepp aceitou até gravar
propagandas e se filiar ao partido", explica Havemann.
Após o término da Segunda
Guerra, Herberger voltou a treinar os jogadores e conduziu a
Alemanha ao título da Copa em
1954. Deixou a seleção com 162
duelos no currículo, marca jamais igualada por outro técnico.
Sua trajetória de sucesso contrasta com atrocidades cometidas
no mesmo período. A obra registra vários casos de atletas e clubes
banidos do esporte no período,
mas se concentra especialmente
na campanha anti-semita encampada pelas autoridades da bola.
"A federação tolerou alguns
clubes judeus até 1936, porque tinha interesse nos Jogos Olímpicos. Depois, começou a bani-los.
Não posso precisar, mas ao menos mil atletas judeus foram expulsos do futebol. Muitos acabaram mortos mais tarde em campos de concentração", narra.
Um, em especial, tem biografia
emblemática. Julius Hirsch defendeu a Alemanha antes da Primeira Guerra Mundial. Ele foi o
primeiro judeu a vestir o uniforme da seleção. Só que os serviços
prestados não o livraram da perseguição. Foi mandado ao campo
de concentração de Auschwitz
em 1943. Acabou executado.
Texto Anterior: Natação: Brasil tem recordista depois de sete anos Próximo Texto: Trecho Índice
|