São Paulo, quinta-feira, 19 de fevereiro de 2004

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FUTEBOL

Com gosto e com vontade

SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA

Para um placar de antigamente, uma palavra que a minha avó usava: o Santos se esbaldou na Vila, diante do União São João. (o Aurélio traz "esbaldar-se", mas o Michaelis registra um sentido bem diferente do que eu conheço; porém vi, na internet, que muita gente ainda usa o termo como minha avó e eu.)
A goleada melhorou muito meu fim de semana futebolístico -no sábado, vi o sofrível Portuguesa x Ponte Preta no Canindé. Os jogos de futebol internacional no domingo de manhã não melhoraram muito a minha disposição.
Adorei o comentário de um amigo meu sobre o Santos: "É legal ver esse time porque eles gostam de jogar". Bingo! Depois das palavras "atitude", "garra", "pegada", "união", que tal incorporar mais uma à lista do que um time precisa ter? "Gosto".
Já se fala muito em "prazer de jogar bola", mas "gosto" me parece um pouco diferente. Prazer é o resultado, gosto é a causa. O prazer pode aparecer fortuitamente, dependendo da sua disposição no dia. O gosto é cultivado, renovado. Tem a ver com lembrar por que você faz o que faz. Por que quis ser jogador de futebol -para jogar, oras. Driblar, fintar, matar uma bola difícil, desarmar, salvar em cima da linha, fazer o gol. Brincar com a bola, mandar nela.
Sábado, parecia que os jogadores da Ponte não faziam mais questão de jogar futebol. Poderiam ser quaisquer outros, de qualquer time -aconteceu de ser o jogo que vi. Time recuado, com o atacante isolado esperando um chutão, visivelmente interessado em um "empate-fora-de-casa". Muito providencial, mas... E o futebol? Os jogadores não têm vontade de jogar para valer? Não para marcar um ponto, mas para marcar meia dúzia de gols? O técnico não tem vontade de ver e comandar um jogo bonito?
O empate entre Vasco e Americano ganhou muito destaque por força das circunstâncias, mas como tem jogo feio por aí. E feio por opção, por decisão estratégica -e é com isso que eu não me conformo. O time pode ser "pequeno", chato, marcador, sem grandes talentos, mas jogar bola para valer!
Já pensou se os jogadores de um time se "amotinassem" e jogassem com gosto, com loucura pelo jogo, como se estivessem em uma festa com os amigos ou em um comercial da Nike? Ainda que faltasse talento, alguma afinidade com a bola apareceria, por mais que um padrinho tenha forçado a contratação de alguém meio sem jeito. Não é possível que um jogo profissional tenha mais lances feios que uma pelada na praia.
Escrevo antes de ver o jogo da noite, mas uma partida não vai mudar minha impressão: o time do Santos gosta de futebol; os jogadores gostam de jogar juntos. Isso vale mais do que qualquer outra idéia de "grupo unido". Com que alegria eles comemoravam os gols uns dos outros!
Felipe, do Flamengo, está gostando de jogar. Alex, do Cruzeiro, também, e como dá gosto ver o que ele faz. Jogadores de futebol do Brasil, longe que estejam do talento desses dois, rebelai-vos! Exijam futebol em campo.

Concentração de renda
O país numa draga e o pay-per-view batendo recordes, segundo os responsáveis pelas vendas. Não acredito que melhorar só na parte de cima seja a saída para o futebol ou para qualquer outra coisa.

Idem
Os times mais ricos, que vendem mais ingressos, pagam mais barato por unidade (R$ 0,25, contra os R$ 0,60 pagos pelos menores).

Deprimente
Bandos de fanáticos criaram cenas de guerra no metrô e na marginal Tietê. Fica difícil acreditar em torcedores menos imbecis quando estudantes universitários também protagonizam barbaridades a título de "recepção aos calouros".

E-mail
soninha.folha@uol.com.br


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