São Paulo, sexta-feira, 19 de junho de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

XICO SÁ

Boleiros de boa vontade


No futebol, onde impera a trairagem, foi de espantar e comover ver seis jogadores do Flamengo salvarem um colega

AMIGO TORCEDOR , amigo secador, nestes tempos em que o brasileiro não é solidário nem no câncer, foi comovente a atitude dos atletas do Flamengo que seguraram no time o colega Alex Cruz, um desses rapazes tímidos, honestos e silenciosos que vêm do interior para vencer na cidade grande.
O moço de Ivinhema (MS), a exemplo das Macabéas que teimam na contramão da existência, seria dispensado nesta semana pelo clube. Acabaria aí o sonho carioca no rubro-negro. Mas eis que existem homens de boa vontade na face da terra. Os cavalheiros Bruno, Ibson, Emerson e Adriano foram à diretoria interceder pelo meio-campista.
Em ato digno dos tempos da Democracia Corintiana do doutor Sócrates e grande elenco, os cidadãos conseguiram manter Alex no Flamengo. Não com o discurso do "coitadinho". Pelo contrário. Os quatro cavalheiros avalizaram o futebol do rapaz. Para eles, o sul-mato-grossense só não brilhou ainda por causa da exagerada timidez de caboclo.
Logo se juntaram ao quarteto solidário mais dois homens de bem: o sérvio Petkovic e o brasileiríssimo Leonardo Moura. Vão bancar até o salário do garoto, cerca de 6.000 mangos. Tudo bem, seria responsabilidade dos cartolas, mas a vaquinha só enobrece mais ainda o gesto. Em tempos anestesiados como estes, demissões e dispensas injustas, como seria a do rapaz de Ivinhema, não mobilizam mais as criaturas.
Nas ruas, então, e aqui amplifico a pieguice destas mal traçadas -todo gesto solidário é aparentemente piegas-, ninguém ampara mais epiléptico. Vale a desconfiança covarde que atribui a todo desconhecido o rótulo de golpista ou gatuno.
O brasileiro só é solidário hoje no cadarço. Já reparou, amigo? Então tente caminhar uns 100 m com as cordinhas do sapato desamarrado.
Sempre vem lá um filho de Deus a berrar: "Moço, o cadarço está solto", "Moço, cuidado, o cadarço...".
Até o Edgar, não o corvo secador, falo do personagem de "Bonitinha mas Ordinária", do Nelson Rodrigues, diria que o brasileiro só é solidário na amarração do pisante. O sobredito crápula é o responsável, na peça, pela frase "O mineiro só é solidário no câncer", atribuindo a sentença ao amigo Otto Lara Resende. No futebol, que tem mais traíra do que no açude do Penedo -o mar da minha infância-, a solidariedade é um caso ainda mais raro. Daí o espanto e a comoção com o bonito gesto dos cavalheiros da Gávea. Paz na terra aos boleiros de boa vontade.

O corvo e a rodada
Finalmente o corvo Edgar, que desde a mudança do baixo Augusta para a Vila Pompéia não funcionava, pousou no ombro Armani de Luxemburgo e brecou o avanço do Palmeiras na Libertadores. O agouro foi maior do que novo milagre. Como seca, quase sempre, os times apontados como favoritos, Edgar pousou também na sorte do Inter. Corinthians campeão da Copa do Brasil, ele garante. É, faltou ao colorado um Carlinhos Bala, só para lembrar mais uma vez o título do Sport Recife no ano passado.
E, para mostrar que está de volta, meu estimado corvo cerrou fileiras ontem com a maldição das múmias do Egito e a sabedoria dos novos faraós ludopédicos. Amarrou as pernas da Azzurra. Dá-lhe, garoto!

xico.folha@uol.com.br


Texto Anterior: Ação: Ao sabor das ondas
Próximo Texto: Brasil de Dunga tem atuação de gala
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.