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São Paulo, domingo, 19 de outubro de 2003

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Luxemburgo diz nunca ter feito nada de errado e culpa diretoria de Palmeiras e Corinthians por conflitos nos clubes

Técnico apaga passado e critica paulistas

DA REPORTAGEM LOCAL

Wanderley Luxemburgo, 51, diz que "amadureceu" no Cruzeiro. Nesta entrevista à Folha, o treinador afirma que faltou respaldo das diretorias de Corinthians, em 2001, e Palmeiras, no ano passado, a seu trabalho e não esconde a decepção pela maneira como deixou os clubes. "Eles não acreditaram no meu projeto, o Cruzeiro sim." (EDUARDO ARRUDA)

 
Folha - Como é sua rotina em Belo Horizonte?
Wanderley Luxemburgo -
Eu levo a rotina normal de futebol que sempre tive. Aqui a rotina de vida é mais tranquila. Temos menos opções de ir de um lado pro outro, você fica mais com os amigos, é uma cidade mais acolhedora.

Folha - O que você mudou no seu planejamento para disputar esse torneio de pontos corridos?
Luxemburgo -
Nesse tipo de competição, você tem que entrar já num percentual de 70% para cima. Todos os jogos são decisivos. Não adianta você querer jogar partidas decisivas do meio da competição para a frente.

Folha - Você considera essa a fórmula ideal para o Brasileiro?
Luxemburgo -
Não era contrário aos pontos corridos, mas é que a nossa cultura sempre foi a de finais. Só que, disputando a competição, você vê que ela é boa. E, se for enxugada para 18, 20 clubes, ela vai ficar muito boa. As duas divisões vão ficar fortes. E vai fazer com que os clubes, em vez de se acomodarem, se estruturem. Eles vão ter que enxergar diferente.

Folha - Você acha que essa [organização] é a diferença do Cruzeiro para os demais clubes?
Luxemburgo -
O Cruzeiro se planejou para a competição. Nós temos um elenco versátil, com jogadores que atuam em mais de uma posição. O Maldonado, por exemplo, sabe jogar de volante e zagueiro. O Maurinho joga de lateral e volante. Então você tem um elenco equilibrado e versátil e ainda tem a expectativa de usar os juniores. Isso é fundamental num campeonato de 46 jogos.

Folha - O que aconteceu para que o Alex voltasse a jogar bem e se tornar o principal jogador da equipe?
Luxemburgo -
O Alex viveu momentos de irregularidade na carreira, como qualquer outra pessoa. Agora direcionou a carreira dele de novo. Veio para o Cruzeiro, e o clube deu a condição para ele desenvolver o trabalho. Ele se motivou a voltar para a seleção brasileira. Nós fizemos um trabalho em que ele reduziu o percentual de gordura de 14% para 8,5%. Mas, independentemente disso, ele sempre foi talentoso.

Folha - Esse Cruzeiro é o melhor time que você montou?
Luxemburgo -
Não acho. Eu estou fazendo aquilo que eu sempre fiz. O dirigente não é profissional de futebol, ele é dirigente. Eu acho que minha saída do Corinthians foi em razão de eu ter feito aquela reformulação no meio do ano, e o time não deu aquela resposta imediata no segundo semestre [de 2001]. No ano seguinte, deu a resposta. Aqui faço tudo que queria fazer no Corinthians, gerenciar o futebol com as outras pessoas. Contratar visando o custo/ benefício, investimento, projeção.

Folha - Você teve uma fase difícil em 2001 no Corinthians e outra no Palmeiras, no ano passado, antes de acertar com o Cruzeiro. Você achou que depois daquelas experiências sua carreira pudesse não decolar mais?
Luxemburgo -
Eu não achei, vocês [imprensa] acharam. Esqueceram que minha carreira era vencedora. Para vocês, eu tenho sempre que provar alguma coisa. Como é que minha carreira iria para baixo, se depois da minha volta ao futebol, após aquela confusão todinha, que eu sempre disse que não passava nada a não ser o Imposto de Renda, que já me condenaram, mas estou com recurso no STF, fui campeão de uma competição e vice de outra.

Folha - Mas você teve problemas. Não foram saídas boas...
Luxemburgo -
Eu não tive problema nenhum, não. Eu ter saído do Palmeiras para ter vindo para o Cruzeiro foi por opção profissional. Eu indiquei vários jogadores, o clube tinha condições de fazer, mas o presidente não quis fazer. Eu entendi que não ia avançar mais do jeito que estava. Só eu iria trabalhar, trabalhar, e não via perspectiva para poder crescer com o time do Palmeiras. Foi uma opção profissional. Mas me apontaram como responsável por ter colocado o Palmeiras na segunda divisão e não viram como o clube estava sendo conduzido.

Folha - Você tirou lições dessas passagens turbulentas?
Luxemburgo -
Eu não tirei lição nenhuma, mas você vai amadurecendo. Eu sempre fui muito ético nas minhas passagens pelos clubes, mas nem me deram satisfação por eu ter saído do Corinthians. Então me senti no direito de achar que no dia em que tiver proposta melhor eu tenho o direito de ir embora também.

Folha - Você ganhou os principais torneios do país em grande quantidade, mas pouco conquistou no exterior. Há um trauma por isso?
Luxemburgo -
Eu não tenho uma Libertadores nem um Mundial interclubes. Mas, se eu não ganhar a Libertadores, quer dizer que sou um fracassado? Alguém tem que ganhar. A Libertadores é um torneio importante e vou trabalhar para ganhá-la, como estou trabalhando para ganhar o Brasileiro. Eu não posso me sentir frustrado se não ganhar porque nem todo mundo consegue ganhar.

Folha - O que significa para sua carreira poder dar o primeiro título brasileiro ao Cruzeiro e ser o único técnico tetracampeão do torneio?
Luxemburgo -
Na minha cabeça não muda nada porque ainda estamos caminhando para ganhar esse título. O mais importante é ganhar. É assim que funciona.

Folha - Você ainda tem o sonho de trabalhar na Europa?
Luxemburgo -
O meu contrato diz que, se aparecer um clube da Europa em que possa desenvolver o meu trabalho, existe uma cláusula me liberando. Para um clube do Brasil, eu posso até sair, desde que se pague uma multa. Mas para a Europa, não. Foi uma exigência minha e é algo interessante para a minha carreira.

Folha - E a seleção brasileira?
Luxemburgo -
Não. Eu estou torcendo muito pelo Parreira, assim como torcia para o Felipão.

Folha - Temos grandes clubes hoje com salários atrasados. A crise financeira está afetando também as equipes em campo. O que deveria ser feito para mudar isso?
Luxemburgo -
Eu acho que você não começa a construir um prédio pelo 12º andar, mas, sim, pela fundação. E a Lei Pelé começou pelo 12º andar. Ficou muito mais fácil tirar jogador do Brasil hoje. Estamos perdendo jogadores até para a Ucrânia. Temos de ter de volta os investimentos de grandes empresas, abrir novamente o mercado do futebol para que possamos segurar por mais tempo os melhores atletas aqui.

Folha - Você entrou no Refis?
Luxemburgo -
Esse é o único problema que tenho, e eu quero zerar isso. Mas o Refis não foi feito para mim. Eu estava discutindo juridicamente com a Receita Federal a ação criminal e a fiscal. Eu estava na Justiça, e o Refis veio para todo brasileiro que estava na Justiça repensar. Podem vasculhar, buscar, virar de ponta cabeça, como fizeram com a minha vida todinha, que não vão achar nada. Eu nunca fiz nada de errado.



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