São Paulo, domingo, 19 de novembro de 2006

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morumbi, 16h

São Paulo joga hoje pelo título e por seus goleiros

Para 70 mil, time busca fechar conquista do Brasileiro e homenagear jovens reservas vítimas de tragédia em agosto

Acidente, que há três meses mexeu com espírito do grupo, transforma-se em arrancada fulminante para inédita conquista em casa

Antônio Gaudério/Folha Imagem
Recuperado de lesão, o goleiro e capitão são-paulino Rogério corre ao lado do reserva Bosco


LUÍS FERRARI
TONI ASSIS

DA REPORTAGEM LOCAL

Há três meses, para encarar uma missão quase impossível, derrotar o Internacional em Porto Alegre e levantar a Libertadores, o São Paulo recorreu a um inusitado "doping psicológico". Dedicaria a conquista aos goleiros Bruno e Weverson, envolvidos em grave acidente de carro dias antes da decisão.
A coroa continental não veio.
E a homenagem aos jogadores -o primeiro, tetraplégico e ainda internado, o segundo, morto- enfim pode acontecer hoje, diante do Atlético-PR, a partir das 16h, no Morumbi.
Caso feche a rodada com mais de seis pontos sobre o Inter, o São Paulo conquistará o Brasileiro com duas rodadas de antecedência, encerrando um jejum de 15 anos no Nacional. A missão é bem mais simples que a do rival: a folga atual sobre os gaúchos é de sete pontos.
A conquista será como o ponto final de um dramático capítulo na história do clube. Até quem não entrou em campo no Beira-Rio sentiu o impacto do acidente dos goleiros.
É o caso do volante Josué. "É muito duro olhar para onde eles ficavam e agora saber que o Bruno está no hospital e o Weverson faleceu. Isso abalou a gente demais. E pesou na final de Porto Alegre", conta ele.
O duro golpe virou ponto de honra. Se a superação não veio na Libertadores, nos dias que se seguiram à tragédia, no Brasileiro ela não poderia escapar.
Para tanto, a equipe de Muricy Ramalho engatou uma seqüência de 19 partidas na qual perdeu somente uma vez. Nessa série, em apenas dois jogos a equipe não balançou as redes.
A boa produção ofensiva, responsável por 36 tentos no período, foi acompanhada de uma defesa sólida -a última vez que o time levou mais de um gol foi no dia 24 de setembro. Nos últimos três jogos, não foi vazado.
Fora de campo, os goleiros Bosco -que atuou nas últimas duas partidas- e Rogério, que treinavam com Bruno e Weverson diariamente, lideraram o movimento de apoio aos acidentados e seus parentes.
A perda dos atletas continua latente. O zagueiro Alex Silva, companheiro dos dois no CT da Barra Funda, narra que, por pouco, não estava no carro no acidente de 11 de agosto na Régis Bittencourt.
"Morava com eles no CT e éramos muito amigos. Eles me convidaram para sair no dia do acidente. Por Deus eu não fui. Quando soube, chorei muito", diz o defensor, um dos muitos atletas que prometem alguma homenagem aos arqueiros se o título for confirmado hoje.
Assim como o zagueiro recém-promovido das categorias de base, o tarimbado lateral-esquerdo Júnior também afirma ter se abalado bastante com o episódio. "Mesmo eu, um dos mais velhos do grupo, chorei bastante. Foi um choque."
Os jogadores avaliam que o acidente afetou também Rogério, o capitão e líder do time, que considerava os reservas como seus discípulos. Num treino neste ano, o camisa 1 recebeu as visitas de suas filhas gêmeas no gramado. Ele estava sentado no centro de um dos campos do CT, ao lado de Weverson, a quem uma das garotas chamou de "estranho". "Ele não é estranho", respondeu Rogério à menina, "é um grande amigo do papai", falou, aludindo ao goleiro de 19 anos a quem autorizava raras liberdades.
Uma delas foi convidá-lo para dividir o quarto na concentração, depois de saber que Weverson teria de dormir no chão de um dos quartos do CT. Rogério tem um quarto exclusivo e, quando foi com a seleção para a Copa, o deixou aos cuidados do jovem goleiro, que, como o ídolo, batia faltas e se destacava ao pegar pênaltis. Imitava Rogério também nos detalhes -até o chaveiro do carro era igual.
Detalhes de uma convivência que virou tragédia que virou promessa frustrada que virou nova investida e que hoje, enfim, deve fazer o time alcançar seu quarto título nacional, o primeiro desde 1991, o primeiro no Morumbi, que até hoje só viu forasteiros darem volta olímpica por Brasileiros.
Uma homenagem feita apenas pelos jogadores, já que a diretoria são-paulina avalia que a lembrança traria tristeza num momento de alegria.


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