São Paulo, sábado, 20 de março de 2004

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Estudo da Uefa aponta um rombo de US$ 7,78 bilhões e revela que clubes de Itália, Inglaterra, Alemanha, Espanha e França operam com as contas no vermelho

Futebol europeu afunda e deve mais de 150 Ronaldos

JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
DA REPORTAGEM LOCAL

Tido até há pouco tempo como exemplo a ser seguido pelo futebol brasileiro, o futebol europeu passa por seu inferno astral.
Estudo preparado pela União Européia de Futebol mostra que a soma das dívidas dos clubes das cinco principais ligas do continente chega a US$ 7,78 bilhões -156 vezes o que o Real Madrid desembolsou para ter Ronaldo.
Alemães, espanhóis, franceses, ingleses e italianos estão no vermelho. A situação é pior no caso da Itália, onde só para o governo federal a soma das dívidas dos times da primeira divisão ultrapassa os US$ 600 milhões.
No Brasil, a estimativa do Clube dos 13, entidade que reúne 20 dos principais times do país, é que a dívida do futebol com o Instituto Nacional do Seguro Social é de cerca de US$ 150 milhões.
No início da temporada 2002/ 2003, o endividamento acumulado de todos os clubes da Itália, de acordo com os dados da Uefa, chegava a US$ 2,29 bilhões. No mês passado, quando foi feito o estudo, ela já atingia os US$ 3,21 bilhões, já que apenas um time -a Juventus- lucrou em 2003.
Devido à crise do setor, o governo italiano já admite a adoção de medidas para ajudar os clubes de futebol. ""Vamos ver, estamos discutindo [a questão]", disse ontem o premiê Silvio Berlusconi, ele mesmo proprietário de um dos times da Série A italiana, o Milan, que tem dívidas estimadas em US$ 150 milhões.
O premiê enfrenta, no entanto, oposição na iniciativa dentro do próprio governo, já que foram comprovadas manipulações de balanços em 7 das 18 equipes da primeira divisão do Italiano.
Elas sofreram devassa das autoridades locais depois dos escândalos financeiros dos grupos Cirio, ex-controlador da Lazio, e Parmalat, que possuía mais de 95% das ações do Parma.
""Nos anos 90, o futebol europeu teve uma grande expansão, mas o que houve foi uma bolha, como a da internet. Os clubes receberam uma enorme ingestão de recursos, especialmente da TV, mas não souberam administrá-los da forma correta e saíram gastando mais do que deviam", disse Patrick Foer, um dos consultores de marketing contratados pela Uefa.
Para ele, um dos principais problemas deu-se com a folha salarial. ""Na maioria dos clubes analisados, não só no mercado italiano, mas também na Espanha, na Inglaterra, na Alemanha e na França, os salários cresceram mais do que as receitas. Enquanto elas aumentavam no máximo 10% por ano, o que já é muito, encontramos casos em que a folha de pagamentos chegava a crescer até 80% de um ano para o outro."
Na Alemanha, onde os clubes deviam, em conjunto, US$ 109 milhões em 2000, o débito do futebol passou para US$ 920 milhões no início do ano.
A crise começou com a quebra da ISL, gigante de marketing esportivo que foi parceira da Fifa desde os anos 70 e detinha parte dos direitos de transmissão das Copas de 2002 e 2006. Em 2001, parte de sua massa falida foi para o grupo Kirch, da Alemanha, que passou a ter, sozinho, os direitos de TV dos dois Mundiais.
Só que, com problemas financeiros, o grupo de mídia não conseguiu vender os direitos como esperava -o continente africano, por exemplo, exceção feita à África do Sul, recebeu-os de graça- e também foi à bancarrota.
A Bundesliga, responsável pelo torneio alemão, sofreu prejuízos com a crise do grupo Kirch, e as receitas dos clubes foram reduzidas. Só as ações do Borussia Dortmund caíram 39% entre 2001 e 2002, quando os direitos de TV na Alemanha foram renegociados.
Segundo o consultor de gestão Luiz Augusto Veloso, para tentar sair do buraco o Borussia passou a negociar com um fundo de investimentos londrino empréstimo emergencial de US$ 123,5 milhões -a ser pago em 12 anos com uma porcentagem da renda de seus jogos em casa.
Além disso, o clube acertou com seus jogadores uma redução salarial de 20%, aproveitando parte da economia com a folha para formar um fundo para premiação em futuras competições.
É uma saída que, segundo Veloso, que é ex-presidente do Flamengo, poderia ser estudada pelos dirigentes. ""Quando você analisa os orçamentos dos clubes brasileiros, a primeira coisa que vai ver é que o fator salário tem um peso incompatível com as receitas que eles têm. Você não pode mais dolarizar os salários dos atletas."
"O mercado de trabalho do futebol é globalizado, e Brasil e Argentina fornecem os maiores craques. É ilusão pensar que no auge da carreira deles vamos conseguir segurá-los aqui", concluiu.


Com agências internacionais


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