São Paulo, sábado, 20 de novembro de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

RITA SIZA

Estupidamente gelada


A vitória por 4 a 0 de Portugal sobre a Espanha foi uma vingança do duelo nos oitavos de final da Copa


HÁ UM FADO antigo, com um refrão que diz: "Ó tempo, volta para trás". Tenho a certeza de que foi isso o que pensaram os jogadores de futebol de Portugal e Espanha, no fim do jogo amigável de promoção da candidatura ibérica à organização do Mundial de 2018 -e por razões diferentes.
Os portugueses, sem dúvida, pensaram: "Mas por que raio não jogamos assim na África do Sul?". E os espanhóis devem ter pensado: "Ainda bem que eles não jogaram assim na África do Sul". Se calhar, até acrescentaram: "Ufa!". Nos oitavos de final da Copa, prevaleceu a Espanha (1 a 0). Esta semana, ganhamos nós (4 a 0). Como vingança, esta não é fria, é estupidamente gelada.
Revisitar a história pode ser um exercício divertido ou doloroso, e a bem dizer, nesta última futebolada, foi os dois.
Para os espanhóis, deve ser um alívio recordar os momentos felizes do Mundial africano e perceber como nessa época os vizinhos rivais lhes fizeram o favor de não estragar a festa.
Para os portugueses, não deixa de ser um consolo constatar que essa derrota de há cinco meses, que tanto custou a engolir, afinal não era inevitável, e que a Espanha (exactamente a mesma que sucumbiu à goleada) era um conjunto perfeitamente acessível.
"Ó tempo, volta para trás."
Se os jornalistas portugueses foram pródigos em imagens musicais -do fado ao bailinho, uma maravilha-, a imprensa espanhola abusou das metáforas tauromáquicas no relato da partida.
O desportivo "As" falou em "cornada ibérica". "Portugal nos torea", escreveu o "Marca". Deve ter sido por causa dos olés que o público foi gritando enquanto Portugal tocava a bola e arrancava perante o olhar incrédulo da "La Roja". O jornalista não descurou a comparação com o momento fatal da lide: "Portugal tinha a lição estudada: esperou e depois deu o golpe no pescoço do vizinho".
Quando chegaram as explicações, honesto, o selecionador português confessou que nunca esperara -nem sequer planejara- vencer a campeã da Europa e do mundo, e logo por quatro golos.
Envergonhados, os espanhóis trataram de arranjar desculpas para a debacle: que os jogadores estão cansados do ultracompetitivo campeonato nacional, que estavam já a pensar no próximo Real Madrid x Barcelona, que a selecção nunca é capaz de se motivar quando os jogos são a feijões.
É verdade que não havia nem pontos nem títulos em jogo. O que estava em causa, no confronto de quarta-feira, era o prestígio. Pode não ser grande coisa, mas é o que temos, e é melhor do que nada.


Texto Anterior: Foco: Hino do Grêmio vira terapia para garoto com doença rara
Próximo Texto: Recurso público dá R$ 10 mi a feira rica
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.