São Paulo, domingo, 21 de fevereiro de 2010

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PAULO VINICIUS COELHO

A medida da ousadia


Falta algo para virar a chave que recoloca o Palmeiras entre os clubes brasileiros de títulos inquestionáveis


ANTÔNIO CARLOS chega ao Palmeiras repetindo a frase que caracterizou o início de ano de Muricy Ramalho: "Temos um bom time, não um bom elenco". Porque se esforçou lentamente para contratar, Muricy Ramalho define o Palmeiras como clube cheio de características de um vencedor, exceto uma. "Falta ousadia", diz Muricy. O vice-presidente do Palmeiras Gilberto Cipullo discorda do ex-treinador e rebate: "Ele diz isso, mas nenhum dos jogadores que contratamos foi indicado pelo Muricy".
O sonho do Palmeiras, desde que Cipullo assumiu o departamento de futebol, em 2007, é ter a hegemonia no futebol brasileiro. Em certa medida, é ser o que o São Paulo, adversário no clássico desta tarde, foi ao longo dos últimos anos.
Para isso, é preciso ousar, mas não foi por outro motivo a contratação de Muricy Ramalho, em julho passado. No mês seguinte, o Palmeiras também ousou para trazer Vagner Love de volta da Rússia, o que provocou neste espaço uma coluna intitulada "A ambição é verde", publicada em 30 de agosto.
Ok, a palavra exata pode não ser ousadia. Mas é certo que tem faltado alguma coisa para virar a chavinha que separa o Palmeiras dos times de resultados medianos e o recoloca entre aqueles de títulos inquestionáveis. O que Muricy chama de ousadia, os ingleses talvez chamassem de... know-how.
Saber fazer é, em duas palavras, saber fazer. Não se explica. Nos anos 90, quando Antônio Carlos Zago era zagueiro do Palmeiras, a gestão do futebol passava por José Carlos Brunoro, da Parmalat, e por um industrial gentil, rápido e capaz de tocar o dedo na ferida. Chamava-se Seraphim Del Grande.
A medida mais discreta da última quinta-feira, quando saíram Muricy Ramalho e o gerente de futebol Toninho Cecílio, foi a volta Seraphim Del Grande ao cargo de diretor de futebol do Palmeiras. Histórico conselheiro de Cipullo, Del Grande é a voz escolhida para dizer "acelere", "recue" ou simplesmente "ouse".
Eram outros tempos, de fato. O Palmeiras tinha dinheiro e, por isso, contratava os jogadores que queria, pelo preço que quisessem cobrar. Se precisava de um zagueiro, pagava US$ 1,2 milhão para repatriar Antônio Carlos, aos 23 anos, do Albacete, da Espanha. Em comum com aquele tempo, sobrou apenas a escolha do novo técnico. Ela é ousada.
Vanderlei Luxemburgo chegou ao Palmeiras aos 40 anos, como Antônio Carlos Zago. "O Vanderlei já tinha conquistado o título paulista, tinha mais currículo, mas era de fato uma aposta", lembra Gilberto Ci- pullo, escudeiro de Seraphim Del Grande naquela época.
Da chegada de Luxemburgo, em 1993, até o título da Libertadores, em 1999, seis anos e seis treinadores se passaram: Luxemburgo, Carlos Alberto Silva, Valdir Espinosa, Luxemburgo de novo, Márcio Araújo e Felipão. Foram seis títulos também. A lista de treinadores do Palmeiras dos dez anos seguintes tem o número 17 ao lado do nome Antônio Carlos Zago. Nesse mesmo período, o clube conquistou um mísero título paulista. O que está faltando -ou sobrando- Muricy chama de ousadia. Gilberto Cipullo discorda. Dezessete técnicos depois, talvez o mais certo seja chamar de convicção.

pvc@uol.com.br


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