São Paulo, sábado, 21 de março de 2009

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JOSÉ GERALDO COUTO

Dente de leite, joelho de vidro


Contra Neymar, Ronaldo faz no clássico de amanhã o segundo duelo com jovens candidatos à sua sucessão


RONALDO ENTRA em campo amanhã, no Pacaembu, para um segundo round contra candidatos a seus sucessores. No primeiro desafio, contra Keirrison, do Palmeiras, o Fenômeno saiu amplamente vencedor.
Desta vez, o duelo é com o garoto Neymar, de 17 anos, espinhas no rosto e aparelho nos dentes, a maior promessa do Santos pós-Robinho. Neymar não é propriamente um centroavante como Keirrison e Ronaldo. É mais um meia-atacante ou o que antigamente se chamava, poeticamente, "ponta-de-lança". Mas também faz gols, bonitos por sinal.
Mas a maior diferença entre Ronaldo e Neymar, hoje, além dos 15 anos de idade que os separam, é que o primeiro tem sido poupado pela violência dos beques adversários. Ronaldo não sofreu sequer uma falta (na verdade, sofreu uma, não marcada, contra o Palmeiras) nas três partidas em que atuou com a camisa do Corinthians. Já os zagueiros têm batido sem dó no novato Neymar. Ele sofre, em média, 5,3 faltas por partida, algumas delas brutais.
É fácil entender a diferença de tratamento. Ronaldo inspira respeito no rival por seu passado glorioso, por sua inegável categoria, mas também pelas sucessivas lesões que sofreu e que truncaram sua carreira.
Neymar, por sua vez, é o novato ousado e abusado, que os adversários (e talvez até os companheiros) têm vontade de "colocar no seu devido lugar". O espírito é mais ou menos o daquela deliciosa frase de Romário: "O cara está chegando agora e já quer sentar na janelinha?".
Claro que há maneiras mais criativas e civilizadas de baixar a crista de um craque nascente. O grande Djalma Santos, já na reta final da carreira no Palmeiras, topou várias vezes pela frente com o jovem ponta-esquerda Edu, que despontava no Santos como um driblador endemoninhado. Sua receita para arrefecer o atrevido era tentar aplicar-lhe um chapéu ou uma bola entre as pernas logo nos primeiros minutos de partida.
Nem todo mundo tem a finesse de um Djalma Santos. A grande maioria dos zagueiros opta pelo método traumático -Neymar que o diga.
Longe de achar que o respeito dos rivais a Ronaldo tem sido exagerado, penso que deveria ser estendido a todo jogador, seja ele craque ou perna-de-pau. Atingir o joelho de um futebolista é barbaridade comparável a martelar os dedos de um pianista ou cegar os olhos de um pintor.
Tostão escreveu uma coisa muito lúcida aqui: "Ser guerreiro não significa trombar nem guerrear com os adversários. Ser guerreiro é não se esconder do jogo, crescer nas adversidades e transpirar bastante pelo corpo e pela alma".
Nesta semana, a mesma concepção distorcida de virilidade que costuma justificar a violência em campo foi responsável por um falso escândalo que se propagou de Florianópolis para o mundo.
Jairo, do Figueirense, eleito o pior num "rachão" realizado pelo elenco, recebeu como castigo treinar vestido com uma bata cor-de-rosa.
O atleta levou a coisa numa boa e treinou normalmente. Mas no dia seguinte não pôde sair à rua por causa das provocações. TVs e sites do mundo inteiro tinham difundido a imagem do rapaz em trajes considerados pouco machos.
Ora, esse pessoal não tem mais o que fazer?


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