São Paulo, sábado, 21 de julho de 2007

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A vila como ela é

Reportagem da Folha passa cinco horas na casa dos atletas no Pan do Rio e descobre craques da pista de dança, flagra cantadas e ganha mosca no jantar

SÉRGIO RANGEL
DA SUCURSAL DO RIO

Os cubanos lotam a pequena sala de internet gratuita, vibram diante da TV com a vitória das compatriotas contra as brasileiras no vôlei e um casal de atletas namora escondido na área de serviço de um dos apartamentos. Os haitianos se divertem na piscina e flertam com as brasileiras. Os voluntários tietam e tiram fotos de tudo. Boas dançarinas, as jamaicanas dão show na pista e animam a badalada boate.
Estas são apenas algumas das cenas presenciadas pela reportagem da Folha nas cinco horas em que esteve na Vila Pan-Americana, anteontem.
Construído para abrigar os cerca de 5.500 atletas que disputam os Jogos, o condomínio de 17 prédios é o local mais reservado do Pan. Centenas de homens da Força Nacional tomam conta dos edifícios, e somente poucos credenciados têm acesso aos atletas.
Apesar do frio e do pouco sol que fazia no dia da visita, cubanos e haitianos se divertiam à beira da piscina. "Isto aqui é fantástico. O melhor lugar que já fui", afirmou Wiselet Saint Louis, 17, jogador de futebol do Haiti, pouco antes de mostrar suas habilidades em outro esporte: os saltos ornamentais.
"Desculpe, mas vou dar um grito. Meninas!!! Vamos tomar banho juntos?", bradou, em um inglês macarrônico, para duas voluntárias brasileiras.
Além de Louis, os outros sete jogadores da seleção também rasgavam elogios para a Vila. "Estou realizando um sonho. Sempre adorei o Brasil. Apesar de ser difícil comprar alguma coisa por aqui, vou guardar por toda a minha vida o carinho de todos", disse o zagueiro Widner Saint Cyr, que mora com a avó em Porto Príncipe. Os pais dele morreram de malária.
Mas, apesar da alegria dos haitianos, são os prédios da delegação de Cuba os mais festivos. A vitória da seleção de vôlei aumentou a empolgação.
A sala de internet, que tem dez computadores, é a mais desejada pelos atletas. O local só fecha às 23h. Mesmo assim, os organizadores têm dificuldades para tirá-los de lá.
A portaria é animada. Um rádio toca sucessos da música cubana. Vários atletas desfilam com celulares, que também tocam músicas, a maioria dançante. Política é assunto tabu.
Mesmo assim, a propaganda pró-regime está espalhada pelos corredores. Cartazes contam detalhes sobre "a revolução no esporte" iniciada por Fidel Castro. Trechos do discurso do ditador, feitos dos esportistas e detalhes da estrutura esportiva do país estão por toda parte. Uma das frases em destaque é de um pronunciamento de Castro de 1963.
Nele, define a base de seu modelo esportivo: "Na revolução no esporte, não se pode conceber um bom atleta que não seja um bom estudante. Não se pode conceber um campeão que não seja bom estudante".
Os jamaicanos também fazem parte dos festeiros. O som de reggae pode ser ouvido nas proximidades do prédio ocupado por eles.
Mas um dos lugares de maior interação dos atletas é no enorme restaurante da Vila, comandado pelo chef Luiz Incao, do Copacabana Palace. No dia da visita, porém, uma convidada inesperada surgiu no jantar.
A salada oferecida tinha uma mosca. "Só posso pedir desculpa. Mas queria deixar claro que isso nunca aconteceu", disse uma funcionária, que rapidamente tratou de tirar o prato.
A visita não estaria completa sem um pulo na boate. Naquela noite, as jogadoras de futebol jamaicanas roubaram a cena com suas coreografias. "Temos que nos distrair um pouco, e aqui é o nosso local preferido. O Rio é ótimo", resumiu uma delas, que escondeu a credencial para não ser identificada.


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