São Paulo, segunda, 22 de março de 1999

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FUTEBOL
Gasto de R$ 83 mil com Nasser, que nem chegou a treinar no time, reforça suspeita de corrupção no Paulista-98
Lusa pagou goleiro do 'jogo do suborno'

Lalo de Almeida/Folha Imagem
O atacante França chuta para marcar o primeiro gol do São Paulo na goleada de 5 a 1 sobre a Portuguesa Santista, no Morumbi


MARCELO DAMATO
enviado especial a Itumbiara (GO)

A Lusa gastou R$ 83 mil para contar durante cinco meses com os serviços do goleiro que participou do jogo que garantiu o time paulistano na segunda fase do Campeonato Estadual de 98.
A Folha obteve o contrato, cuja existência reforça as suspeitas de que pelo menos um diretor do clube participou de um esquema para oferecer dinheiro a atletas da Portuguesa Santista na partida mais importante para a Lusa na primeira fase do Paulista-98, disputada em Santos em 1º de março.
Não há provas de que o dinheiro tenha chegado aos jogadores e atletas desse clube.
A partida terminou 4 a 4, mas, no primeiro tempo, a Lusa goleava por 4 a 0 -três dos gols santistas saíram após os 42min.
Com o resultado, a Lusa seguiu na competição -ironicamente, seria eliminada pelo Corinthians, em uma partida em que foi prejudicada pela arbitragem do argentino Javier Castrilli. À Santista coube disputar o "quadrangular da morte", que definiu os rebaixados à segunda divisão, mas se safou.
Até ontem, a presidência da Lusa negava qualquer relação com Nasser. "Não existe contrato", afirmou o presidente Amílcar Casado, que, como mostra o fac-símile, firmou o documento. Sua assinatura, aliás, reforça a idéia de que a cúpula do clube conhecia a suposta operação.
Já o vice-presidente de futebol, Ilídio Lico, admitiu ter negociado com Nasser, mas negou que o contrato tivesse sido ratificado.
A Folha, contudo, obteve cópias do acordo entre o clube e o atleta. Assinado em 1º de maio de 1998, exatos dois meses depois do "jogo do suborno", o documento revela que o goleiro assinou por oito meses, para receber R$ 12 mil mensais, entre maio e dezembro.
Nasser, 31, reconhece que nem chegou a se apresentar ao clube, mas refuta com veemência o suborno. Ele afirma que foi pago "como cala-boca", pois teria sido informado, inadvertidamente, por diretores da Lusa, do suposto esquema. Segundo o goleiro, o contrato foi rescindido em outubro e, no total, rendeu-lhe R$ 83 mil.
"Esse dinheiro não paga o prejuízo que tive. Já recebi duas ofertas de clubes paulistas, que recuaram quando souberam que era eu", declarou à Folha o jogador, que hoje defende o Itumbiara, de Goiás.
A investigação da Lusa sugere o maior escândalo do futebol brasileiro desde a "máfia da loteria esportiva", também de manipulação de resultados, nos anos 70, e o "caso Ivens Mendes", de interferência nas arbitragens do Campeonato Brasileiro de 1997.
O suposto suborno entrou em papéis oficiais da Lusa em dezembro, quando foi aprovado um relatório que revelou o desvio de R$ 130 mil do caixa do clube e indicou dois supostos culpados.
As suspeitas sobre o desaparecimento do dinheiro existiam desde maio, mas só foram apuradas no segundo semestre.
Em 1999, o assuntou voltou a ser debatido na primeira reunião do Conselho Deliberativo da Lusa, na última segunda-feira.
Tanto a situação como a oposição do clube esforçaram-se para confinar o escândalo no Canindé, mas a Folha teve acesso a parte das conclusões do relatório do Conselho de Orientação e Fiscalização, um órgão consultivo que examina todas as atividades da Lusa. O documento diz que Camões Salazar, um dos diretores do departamento de futebol, e o empresário Toninho Silva teriam dividido os R$ 130 mil destinados ao suborno.



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