São Paulo, sábado, 23 de janeiro de 2010

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MOTOR

A vitória de um perdedor


História de Tommy Byrne, rival de Senna no início dos 80, mostra a importância da imagem no esporte a motor


FÁBIO SEIXAS
EDITOR-ADJUNTO DE ESPORTE

A MELHOR leitura das férias foi "O Melhor Piloto que Você Nunca Viu". É a biografia de Tommy Byrne, escrita em conjunto com o jornalista Mark Hughes. Foi publicada há dois anos, no Reino Unido, pela Icon Books. É fácil de encontrar, o Google existe pra isso.
"Tommy Byrne? Quem é o cara?" Pois é, não vi. Ou não lembro. Você, muito provavelmente, está na mesma. Ainda bem -também por isso- que existem os livros. Byrne, ao contrário de pilotos que lançam biografias a rodo, tem o que contar. Irlandês, criado numa família católica, endividada e desequilibrada na zona rural de Dundalk, começou a trabalhar aos 10, operando tratores. Ali, pegou gosto pelo volante e talvez ficasse nisso não tivesse sido demitido ao ser flagrado pelo patrão tirando um racha num lamaçal.
Aos 17, era um ladrãozinho. A especialidade, depenar carros. Chegou a ser preso ao tentar algo maior, um depósito de pneus de caminhão. Foi nessa época, sem experiência com karts ou coisa parecida, que resolveu se aventurar na velocidade. Foi a Mondello e pagou 25 libras irlandesas para dar 25 voltas num F-Ford. O ano era 1976, e sua vida mudou.
Byrne tinha um talento nato. Fez voltas rápidas, chamou a atenção do dono da escola, foi incentivado a continuar. Comprou um chassi antigo, começou a correr campeonatos locais. Mostrou ser um fenômeno. Daí pra frente, apesar de muitos tombos pelo caminho, deslanchou. Um ano mais velho do que Senna, disputava com ele o status de jovem sensação das pistas inglesas no início dos 80. Duelo feroz: era Byrne levar um título batendo todos os recordes para Senna superá-lo na temporada seguinte. Rixa que quase virou pancadaria quando o irlandês decidiu roubar as rodas da Alfa do rival, parada diante da Van Diemen.
Fora das pistas, porém, a vantagem era toda do brasileiro: um rapaz educado, bem comportado, com dinheiro. Byrne bebia, fumava, cheirava, não tinha onde morar. Sua imagem era tão ruim que, em 1982, ao ganhar um teste com a McLaren pelo título da F-Ford 2000, foi boicotado. Os mecânicos deixaram o pedal do acelerador mais alto para não haver o risco de ele ser mais rápido que Boutsen, outro bom moço. Chegou à F-1, era inevitável. Mas pela Theodore, equipe aventureira. Tentou se classificar para cinco GPs em 82, largou em dois. Desceu ao inferno, correu nos EUA, no México, traficou cocaína em tacos de golfe, levou um tiro. Hoje, reabilitado, é instrutor de pilotagem em Mid- -Ohio, tem uma bela família, é feliz.
Um relato cru, sobre erros, acertos, vitórias, derrotas. Que escancara a importância da imagem no esporte, que a recuperação é possível e que ganhar fortunas pode não ser tudo. Que mostra que a felicidade é possível, mesmo que demore para acontecer. Sempre. Feliz 2010.

fabioseixas.folha@uol.com.br


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