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São Paulo, domingo, 23 de março de 2003

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FUTEBOL

A guerra e o futebol

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

A linguagem do futebol é bastante relacionada à da guerra. Com frequência, escutamos e lemos que a partida será uma luta, uma guerra; que um time massacrou, bombardeou o outro; que o jogador é artilheiro e matador e, se for forte, um tanque cujo chute é uma bomba, um canhão. Está na hora de mudar o termo para míssil.
Nesta semana, a TV Globo de Minas mostrou o técnico Celso Roth, do Atlético-MG, gritando no treino para que os jogadores matassem a jogada. É perigoso dizer isso para o Cleisson.
Numa partida, o adversário é visto como um inimigo que utiliza de todas as armas para vencer a batalha. No final, o prêmio é uma taça, símbolo da guerra conquistada.
As pessoas têm uma agressividade inata. Se estimulada, explode, principalmente quando estão em grupo, como num estádio.
Um líder é capaz de espalhar rapidamente a violência e o ódio. Nesta situação, ninguém se sente responsável pelos seus atos. O culpado é o grupo.
A guerra começou. Refiro-me à guerra, e não a uma partida de futebol. A guerra é decorrente de interesses políticos e financeiros de países e também da ambição, intolerância, ódio e distúrbios emocionais dos humanos. Um grande número de inocentes vai morrer. Absurdo!

A ética e o futebol
A ética é um código de conduta humana, mais relacionado à atividade profissional. "A moral é um sistema de regras, e a essência de toda moralidade consiste no respeito que o indivíduo sente por tais regras." (Piaget)
Os filósofos gregos associavam a ética com a felicidade. Com o tempo, ela passou a ser virtude, dever, obrigação. Contudo, em algumas situações, é melhor obedecer às regras da natureza e da paixão do que às da sociedade e da razão.
Aristóteles disse que a ética não é uma ciência e, portanto, não pode ser ensinada. Jurandir Freire Costa escreveu: "Ter caráter é um aprendizado que depende do esforço individual, mas também dos meios culturais à disposição dos indivíduos".
Não existe um manual de ética. Muitas situações são discutíveis e temporárias. "Consulta aí por favor, o Livro de Ética, última edição: a gente ainda é obrigado a falar bem dos mortos?" (Millôr Fernandes)
Américo Faria disse que não há nada errado em ser supervisor da CBF e empresário de jogadores. Aí é demais. Seria ainda mais grave se ele fosse o técnico. Não era ético também Pelé, no governo FHC, ser ministro dos Esportes e empresário do setor.
As pessoas que exercem duas funções incompatíveis se defendem, dizem que são honestas e que sabem diferenciar uma coisa da outra. Porém é preciso se afastar das tentações. O homem pode ser corrompido até que prove o contrário. Além do mais, dá chance à desconfiança e à dúvida.
Discordo, mas compreendo o apoio público que o Parreira e o Zagallo deram ao Américo Faria. Eles são amigos há muito tempo. A maioria faria o mesmo. Tenho esperanças de que, quando estiverem sozinhos, Parreira tenha dito ao amigo que não é correto fazer as duas coisas.
Geninho foi muito criticado porque se transferiu do Atlético-MG para o Corinthians. Se os profissionais de todas as áreas mudam de trabalho, por que os treinadores não podem fazer o mesmo, desde que seja respeitado o que está escrito no contrato?
Seria antiético se Geninho tivesse uma relação de amizade com o Atlético-MG, garantisse que não sairia e, de repente, fosse embora. Isso seria uma grande decepção.
Ouço muito dizer que a relação de um jogador e um técnico com o clube tem de ser profissional, no seu amplo sentido. Concordo. Mas ela não pode ser fria, apenas de obrigações e direitos. É necessário também afinidade e cumplicidade. Só assim a relação será eficiente, prazerosa e duradoura.

Decisão carioca
O Vasco tem todas as chances de ganhar o título do Estadual diante do Fluminense, hoje. No primeiro jogo, houve equilíbrio, mas prevaleceu a melhor qualidade individual dos vascaínos. Marcelinho foi decisivo.
Como escreveu Fernando Calazans, é nítida a diferença técnica entre os jogos finais de São Paulo e os do Rio de Janeiro. É a realidade. Se as equipes cariocas não melhorarem, elas terão raríssimas chances de conquistar o Campeonato Brasileiro.

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