São Paulo, sexta-feira, 23 de março de 2007

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XICO SÁ

Pata de sapo, pó de ímã e que noite!

Ver São Paulo, Grêmio e Palmeiras caírem, no mesmo dia, em diferentes torneios, só mesmo numa quarta-feira

A MIGO TORCEDOR , amigo secador, ô quarta-feira ingrata, chega tão depressa, só para contrariar os favoritos, só para mostrar que a vida é breve e nada lógica, só para dizer que os feios, sujos e malvados estão no jogo, heróis das linhas marginais, como me sopra aqui a bela Carmencita, minha cigana de Itapevi, para quem acabo de entregar o coração, a sorte e o destino, após várias garrafas de manzanilla no Anhangabaú, vale que os índios tinham como o mais assombrado, mais agourento até do que a beirada esquerda do Tamanduateí.
Com patas de sapo e pó de ímã na elegante sacola de feira, Carmencita chegou disposta a ser a musa definitiva e perfeita dos cavaleiros secadores da mesa-redonda. "Se estes feitiços são capazes de fixar corações volúveis e deixar no chão os homens mais insensíveis, imagine o estrago que não faz em um campo cheio de 22 machos carentes?!", disse e sorriu com um sorriso maldito, aqueles sorrisos assustadores de ópera.
Foi a desalmada abrir a boca e o São Paulo fazer o seu gol espírita em Aguascalientes. Calma, cabrón, a peleja está só começando, ela parecia dizer, mesmo com os lindos lábios já devidamente ocupados por uma tarefa que me fazia ir e voltar à beira do meu Capibaribe e do Guadalquivir, o rio da sua aldeia andaluza. A ciganita me acalentava enquanto ouvia, no iPod, o gipsy-punk do Gogol Bordello, tocava a linda "Sex Spider". Rogério perde o pênalti. Estava se desenhando uma noite perfeita. O time mexicano empata.
Ela sorri, como que já contasse com o fim da série invicta dos tricolores. Sempre aos domingos uma ova, eles são traidores, os domingos estão mais para a cegueira de cultos e missas, para os homens que não gostam de futebol, domingo de guarda e dos traidores das artes ludopédicas com qualquer filminho de Hollywood, esses machos-pipoca que nada podem além de chorar precocemente as dores de corno no cinema.
Donde se elege, definitivamente, a quarta, e todas as quartas são de cinzas, como o dia oficial dos secadores. Somente numa quarta é possível, ao lado de Carmencita, ver o Palmeiras perder a pose diante do Ipatinga. Na boa, técnico de boleiro com oclinhos de quem vai à exposição de arte e de quem ouve jazz... Sei não, se eu fosse ele, trocava a armação, este cego que vos fala tem a manha dos melhores pára-brisas da cidade. Na mesma quarta, outro invicto, o Grêmio, caiu em casa para o Esportivo, em pleno Olímpico.
Agora só o Sport Recife, o Leão da Ilha do Retiro, bota banca de imbatível neste ano, sob o comando do técnico Gallo, que, no jogo do bicho ludopédico, é aquele ex-volante do Peixe, o Santos cujo símbolo é uma baleia, Moby Dick inalcançável em todos os mares do mundo. Somente uma quarta-feira, amigo, para ressuscitar o Bahia, que veio direto da Terceirona para ganhar o título da Copa do Brasil -será lindo, os orixás estão unidos, me dizem os búzios da minha ciganita, que já dorme no meu colo enquanto batuco estas mal traçadas na madruga. Porque era quarta, o gol mil de Romário ficou para o Maraca. Só para contrariar Pelé, ele prefere não fazer de pênalti, acho chique! Porque a quarta é a véspera da quinta dos infernos, da dor de cabeça, o dia de bolinar tricolores e verdes. Nunca aos domingos, me diz o compay mexicano de peyotes e tequilas, o Francisco Inojosa de tão bela escrita.
Futebol de macho é o de quarta à noite, chovendo, mesmo com esse desgraçado horário imposto pela Globo e suas novelas de "mierda", perdão pela descompostura, mas isso enche, embora se salve um pouco Camila Pitanga de bela putana, mas essa teria salvação até aqui no meu pobre casebre cujo jardim suspenso dá para a rua Augusta, que está para São Paulo como a Paris do século 19 dos mais líricos flanadores.

xico.folha@uol.com.br


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