São Paulo, quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

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TÊNIS

Afinal, o que é coragem?


Aos 22, isolada das amigas e rodeada de segurança, israelense faz história e dá exemplo de coragem


RÉGIS ANDAKU
COLUNISTA DA FOLHA

HÁ UM ANO , os organizadores do Torneio de Dubai, um dos mais importantes do circuito, barraram a israelense Shahar Peer. Sem o visto que permitia sua entrada nos Emirados Árabes, ela simplesmente não jogou.
Venus Williams saiu em sua defesa, Andy Roddick boicotou a versão masculina, a WTA aplicou multa de US$ 300 mil, e os organizadores, pressionados, acordaram que Peer não teria problemas neste ano.
Na semana passada, lá estava a corajosa Peer. De fato, não teve problemas com o visto. Agora, os problemas foram outros -talvez piores.
Sob a alegação de que a tenista corria risco de morte, os organizadores resolveram isolá-la. Peer só podia ir do hotel para o clube, e de lá para o hotel. Quando estava no clube, não podia sair de uma salinha reservada a ela. Nada de ir a vestiário, academia, refeitório, nada de conversa, nem com outras tenistas.
Em volta de Peer, os organizadores colocaram 16 seguranças para "protegê-la". Apesar do interesse de mais de 200 jornalistas credenciados para o torneio, só um era sorteado para falar com ela depois de cada jogo -isso quando todas as tenistas são obrigadas à entrevista coletiva.
Para o desespero dos organizadores, e mesmo diante da intensa pressão a que estava submetida, Peer derrubou as adversárias uma a uma.
Relegada à quadra um, venceu três cabeças de chave, incluindo a número três do ranking, Caroline Wozniacki. Nas semifinais, viu seu jogo contra a estrela Venus Williams ser marcado para a quadra dois.
Foi a primeira vez, em condições "normais", que uma semifinal foi disputada tão longe da quadra central. Isso pode e acontece somente quando chuva e atraso na programação forçam organizadores a realizar as semifinais simultaneamente, para garantir o andamento do torneio.
Não foi o caso. Enquanto Peer e Venus jogavam diante de 200 pessoas, sob sol inclemente, as coadjuvantes Kveta Peschke, Katarina Srebotnik, Cara Black e Liezel Huber faziam um entediante jogo de duplas para 5.000 lugares na central.
Peer jogou bem, mas não resistiu à ex-número um. Nos cumprimentos ao fim do jogo, Peer agradeceu o apoio de Venus e pediu desculpas por ter obrigado a americana a jogar em uma quadra tão pequena. Venus a parabenizou, reafirmou o apoio e desejou sorte. Abraçaram-se.
Sobre tudo isso? "Foi uma experiência diferente, mas positiva.
Lembrarei desse torneio pelo resto da minha vida. Infelizmente não consegui ganhar, o que era meu sonho. Mas não reclamo. Acho que cresci muito profissional e mentalmente também, sabe?"
Nada disso saiu nos jornais locais.
Em um deles, uma pequena nota informava que Victoria Azarenka faria a final contra Venus Williams. A campeã foi a americana.

reandaku@uol.com.br


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