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Coreia do Norte quer mistério a seu favor na África
Locais de treinamentos não são divulgados, e jogadores da equipe asiática têm sido proibidos de conceder entrevistas
Ídolos de 1966, ano da única atuação do país em Copas, acreditam que a seleção que enfrentará o Brasil em 15 de junho pode chegar à 2ª fase
SÉRGIO RANGEL
ENVIADO ESPECIAL A PYONGYANG
Orgulho patriótico, amadorismo, isolamento, gritaria e
muito mistério. Com essa estratégia, os norte-coreanos
querem surpreender na Copa
do Mundo. O país mais recluso
do planeta será o primeiro adversário da seleção brasileira
na África do Sul. As duas equipes se enfrentam no dia 15 de
junho, em Johannesburgo, pelo
Grupo G, que tem ainda tem
Portugal e Costa do Marfim.
Único time com atletas amadores no Mundial, a Coreia do
Norte treina desde o início do
ano em local não divulgado e se
recusa a mostrar detalhes da
preparação. Nem mesmo seus
jogadores são liberados para
conceder entrevistas.
Anteontem, empataram na
Alemanha com a seleção sul-africana, do brasileiro Carlos
Alberto Parreira. "Eles têm
uma defesa muito sólida. Jogam com cinco jogadores atrás.
Para furar esse bloqueio, é preciso muita paciência", analisou
o treinador após o 0 a 0.
"O enigma é importante. Na
única Copa que disputamos,
surpreendemos por sermos
desconhecidos. Estamos nos
preparando para fazer o mesmo agora", disse Pak Doo-ik,
74, autor do gol da surpreendente vitória norte-coreana
diante da Itália, por 1 a 0, na Copa de 1966, a maior façanha no
futebol da seleção asiática.
Antes da África do Sul, o
Mundial da Inglaterra foi o único disputado pelo país.
Doo-ik é uma espécie de assessor da seleção nacional e deverá viajar para acompanhá-la
na Copa "se a saúde ajudar".
Ele, o zagueiro Lim Zoong-sun, 70, e o goleiro Lee Chang-myung, 64, foram os únicos liberados pelo governo para dar
entrevista sobre o futebol local.
Na conversa de quase uma
hora, eles pouco falaram sobre
a seleção atual do país. Os três
preferiram relembrar do Mundial que disputaram e misturar
futebol com política.
"O nosso povo já superou
uma série de dificuldades. O
nosso presidente eterno [Kim
Il-sung] e o nosso querido líder
[Kim Jong-il ] já nos mostraram isso. Temos uma firme
convicção de que vamos pelo
menos passar para a fase seguinte do Mundial", afirmou
Doo-ik, sentado embaixo dos
retratos dos dois principais dirigentes da Coreia do Norte.
Pai e filho são venerados pelos norte-coreanos. Comandante do país por 49 anos, Il-sung é o autor da "Ideia Juche", misto de filosofia e ideologia que norteia a nação. O Juche proclama a autossuficiência. Il-sung morreu em 1994,
mas o povo o cultua como se
fosse vivo. Centenas de estátuas do "presidente eterno" estão espalhadas pelo país.
Acesso negado
Apesar dos pedidos para
acompanhar os treinos dos adversários do Brasil, as autoridades do governo se recusaram a
liberar o acesso. Os guias diziam apenas que o mistério era
a chave para o sucesso.
Embora fizessem questão de
dizer que o país gosta de futebol, o esporte não é tão popular
na Coreia do Norte. Garotos
chutando bola pelas ruas são
uma cena rara. A modalidade
mais comum por lá é o vôlei.
A Folha foi autorizada a assistir a só uma parte do jogo entre um time do Ministério dos
Transportes Marítimos e outro
de uma universidade da capital
(Pyongyang). As duas equipes
eram da terceira divisão local.
Na TV, o futebol também
não tem espaço. Os três canais
passam o dia fazendo propaganda do regime comunista.
Jogos de clubes europeus são
exibidos como no Brasil dos
anos 60: apenas os videoteipes
das partidas -e com cerca de
três semanas de atraso.
Os guias dizem que os jogos
da seleção norte-coreana passam na TV ao vivo. No entanto,
para a Copa da África do Sul, a
Fifa ainda não vendeu os direitos de transmissão para o país,
que talvez só assista aos teipes.
"Pode parecer antipático,
mas trabalhamos assim. Depois do Mundial, vocês ouvirão
falar muito mais do nosso futebol", declara Doo-ik, que é celebrado nas ruas como um herói.
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