São Paulo, sábado, 24 de maio de 1997.



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Hoje o sonho está repartido democraticamente

MATINAS SUZUKI JR.
do Conselho Editorial

Meus amigos, meus inimigos, São Paulo aspira aquele vertiginoso clima de decisão.
Há tempos essa deliciosa expectativa não era repartida tão democraticamente (não fora o cinza que mancha o azul de maio, esse gostoso desassossego na antecâmara da decisão poderia ser uma completa felicidade).
Não importa que uns estarão desfalcados, nem as condições objetivas dos quatro grandes.
Todos vestirão a camisa do seu time, terão direito à uma fatia do sonho. A esperança é o maior divisor comum da cidade. Ah, e viva o Grêmio!

O número de junho da revista britânica "World Soccer" tem uma página sobre os escândalos do futebol brasileiro. Detalhe: a reportagem foi escrita antes de o "Jornal Nacional" mostrar as gravações com o Ivens Mendes. O mundo começa a conhecer o verdadeiro futebol brasileiro.

Marcelo Duarte, da "Placar", nosso guia universal das curiosidades, dá a dica: Bruce Willis, o chofer de táxi aéreo do século 23, tem uma flâmula da seleção brasileira campeã no remotíssimo ano de 1994.
Confira no filme "O Quinto Elemento".

Tostão tinha estilo, o que não é comum entre os atacantes brasileiros (nesse terreno, a tradição dos atacantes uruguaios talvez seja mais generosa do que a brasileira).
Além do estilo, a cabeça sempre erguida, enxergando longe, era uma espécie de intelectual do futebol: a bola parecia muito mais uma extensão do seu cérebro que dos pés.
Tostão tinha também a capacidade de represar uma tal densidade de sentimentos (amizade, sinceridade, integridade, boa fé) na sua estilística simples, que o seu futebol ficará como um apêndice da antologia dos contistas mineiros.
Para os leitores desta coluna, um presente neste sábado de muita esperança no futebol: a seleção dos jogadores mais elegantes elaborada por Tostão.
Gilmar ("elegante na bela defesa e no frango"), Carlos Alberto ("passadas bonitas e largas"), Djalma Dias ("não sujava o calção"), Luizinho ("jogava bem e com pose") e Newton Santos ("cabeça em pé no desarme no passe"); Dino Sani ("passava a bola como se fosse com as mãos"), Falcão ("o mais elegante e o melhor volante de todos os tempos"), Didi ("arte e beleza nos lançamentos") e Ademir da Guia ("parecia um bailarino de patins no gelo"); Sócrates ("perfeito equilíbrio do corpo") e Giovanni ("uma obra de arte dominando a bola no peito").
Reservas: Raul, Joel Camargo, Zé Carlos, Mengálvio e Evaldo.

Como colunista de futebol, Tostão tem feito interessantes conexões entre esse esporte e a psicanálise. Algumas pessoas me perguntam qual é o interesse em fazer a seleção dos jogadores mais elegantes.
Existem várias respostas.
Uma delas encontrei no interessante livrinho "Monogamia", do descolado psicanalista britânico Adam Phillips: "O charme, a aparência atraente, sempre foram, afinal de contas, o nosso melhor antidepressivo cultural. É o que não deixa as coisas pararem de rolar".
Nem as bolas, acrescento eu.


Matinas Suzuki Jr. escreve às terças, quintas e sábados




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