São Paulo, sábado, 24 de julho de 2010

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JOSÉ GERALDO COUTO

O "futebol ideal"


Os estilos são diversos, mas há que equilibrar o individual e o coletivo, o drama e a festa


VÁRIOS LEITORES espanhóis ficaram chateados com minha última coluna, na qual eu manifestava certa decepção diante do futebol apresentado pela Fúria na Copa do Mundo da África do Sul.
Não sei se foi culpa da tal "barreira da língua" ou se me expressei mal mesmo, mas o fato é que meu texto foi lido por alguns como "ressentimento de perdedor". Em vista disso, eu me vejo obrigado a esclarecer as coisas e a explicitar meu "ideal" de futebol.
Para limpar o terreno, a primeira coisa a varrer para longe é o nacionalismo. Quando eu disse que o futebol apresentado pela Espanha na Copa era uma versão piorada (melhor seria dizer "desvitalizada") do melhor futebol brasileiro, claro que não estava me referindo a nossa seleção que foi à África, que era bem inferior à espanhola, sob quase todos os aspectos.
Eu me referia a equipes brasileiras que valorizavam a posse de bola, a troca de passes, o ritmo cadenciado, mas possuíam também poder de penetração e definição, algo em que, a meu ver, a Fúria, mesmo campeã, ficou devendo no Mundial.
Times como o Santos de Pelé, as seleções brasileiras de 1970 e 1982, o Cruzeiro da segunda metade dos anos 60 e o Flamengo do início dos anos 80 representam o ápice desse tipo de futebol que equilibra a cadência e a contundência. Não por acaso, eram equipes que encantavam e, ao mesmo tempo, faziam muitos gols.
É claro que esse não é o único jeito legítimo e bonito de jogar futebol. O Carrossel holandês de 1974 e a jovem Alemanha do recente Mundial praticaram estilos bem diferentes, mas igualmente belos e eficazes. Assim como o cinema e a literatura, o futebol também comporta gêneros e linguagens diversos.
O meu "ideal" de futebol, portanto, não é somente um determinado esquema tático, ou uma forma específica de jogo. É algo bem mais amplo e difícil de resumir.
O futebol ideal é a conjunção perfeita entre a ação coletiva e o brilho individual, de tal maneira que a primeira não abafe o segundo, e que o segundo não perca de vista a primeira e não degenere em exibicionismo vazio.
É também o ponto de equilíbrio entre o prazer e o drama, a festa e a guerra. Há que se divertir jogando, mas também desejar a vitória, a imposição sobre o outro, a morte simbólica do rival. Entre outras coisas, para que na vida, fora do campo, sejamos fraternos e civilizados.

jgcouto@uol.com.br


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