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Herança do Pan divide governo e COB
Ministério admite discrepância entre materiais esportivos comprados e o que tem sido usado, mas põe culpa no comitê
Entidade comandada por Nuzman diz que guarda equipamentos a pedido das confederações, que sofrem com a Prefeitura do Rio
EDUARDO OHATA
CRISTIANO CIPRIANO POMBO
DA REPORTAGEM LOCAL
GUSTAVO ALVES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Um dos maiores legados do
Pan-2007, os equipamentos esportivos têm provocado dor de
cabeça, confusão e esbarrado
em burocracia para cumprir o
fado de servir atletas e eventos.
Até hoje, 546 dias (1 ano, 5
meses e 27 dias) após os Jogos,
parte dos cerca de 251 mil itens
adquiridos para os eventos no
Rio, que custaram mais de R$
17 milhões aos cofres públicos,
sofre com disputas ou então
dorme em depósito à espera de
catalogação ou pedido de uso.
Pior ainda é que os dois
maiores responsáveis pela
questão, o governo federal e o
COB (Comitê Olímpico Brasileiro), principais articuladores
da candidatura do Rio à Olimpíada de 2016, não falam hoje a
mesma língua sobre o caso.
Enquanto o Ministério do
Esporte justifica que, apesar de
ter cedido os equipamentos do
Pan ao COB -que os repassaria
às confederações de cada modalidade-, ainda não conseguiu concluir a catalogação dos
materiais, o comitê comandado
por Carlos Arthur Nuzman informou à reportagem que os
itens estão catalogados.
Com equipamentos importados e comprados sem licitação,
a aparelhagem do Pan, pelo menos boa parte dela, chegou a ser
utilizada na preparação dos
atletas ao evento. Mas houve
materiais que simplesmente ficaram guardados durante o
torneio, como revelou relatório
do TCU (Tribunal de Contas da
União) de setembro de 2008.
Não bastasse isso, aparelhagens se transformaram em alvo
de queda-de-braço envolvendo
a Prefeitura do Rio, o COB e entidades esportivas.
O imbróglio teve início logo
depois de encerradas as competições do Pan, já que, apesar
de alguns aparatos terem destino certo, outros foram simplesmente levados por dirigentes
ou atletas ao final da participação da modalidade nos Jogos,
como ocorreu com o beisebol.
"A gente foi esperto. Quando
acabou, recolhemos tudo e
trouxemos para o centro de
treinos [em SP]. Ninguém falou
nada até pelo fato de como a
competição terminou [chuvas e
despreparo do local das partidas atrapalharam o torneio]",
disse Jorge Otsuka, presidente
da confederação de beisebol.
Mas nem tudo foi de forma
tão simples como no beisebol.
O boxe foi um dos alvos da
Prefeitura do Rio, que passou a
cobrar a devolução de todo o
material acima de R$ 300.
"Pelo que entendi, o COB até
tentou convencer a prefeitura a
deixar o equipamento com as
confederações. Mas ela disse
não e alegou que era exigência
da cláusula de convênio firmado com o comitê", afirmou Luis
Claudio Boselli, ex-presidente
da CBB, que ainda guarda o ofício da administração municipal
cobrando os materiais.
De acordo com Boselli, o material da modalidade consistia
em sacos de pancada, luvas e
punching ball e acabou doado a
academias carentes. E só não
foi retirado desses locais, afirma ele, após ameaça de chamar
a imprensa para registrar a retomada dos equipamentos.
"Eles querem que tudo fique
dentro do almoxarifado."
Problemas semelhantes viveram os saltos ornamentais.
Após absorver parte da aparelhagem adquirida para a modalidade no parque aquático Julio
Dellamare, a supervisora Alice
Kohler diz também ter recebido carta da prefeitura avisando
que o material seria retirado.
"Quando tirarem o que eu tenho, só sobrará material velho.
A prefeitura não tem escolinha
de saltos ornamentais. Não sei
onde iriam utilizar isso", disse.
À época na prefeitura, Cesar
Maia dizia desconhecer a cobrança, alegando, porém, que
sua administração "investiu R$
1 bilhão em materiais, funcionamento e estrutura do Pan".
A atual administração da cidade, na mão de Eduardo Paes,
após seguidos contatos da Folha, não quis comentar o caso.
Hoje detentor da maior parte
dos equipamentos, o COB diz
que só mantém os aparelhos
sob sua guarda, alojados em
dois depósitos no Rio, "devido
ao fato de que algumas confederações não possuem local
apropriado para o armazenamento". E que eles não correm
risco de depreciação.
Diretores de entidades ouvidas pela reportagem, porém,
contestam, e algumas federações dizem ser muito difícil
contar com o equipamento devido à burocracia -teria de se
reportar primeiro à confederação, que contataria o comitê.
Outro ponto dissonante entre COB e Ministério do Esporte está relacionado ao apontamento feito pelo TCU de que
houve equipamentos que não
foram utilizados no Pan, como
31 dardos, 90 varas e o material
de proteção usado no taekwondo, que chegaram com a competição já em andamento.
O ministério, que firmou cinco convênios com o COB de
2003 a 2007 para a compra dos
materiais, justificou os itens
parados pelo fato "de muitos
atletas preferirem utilizar seus
próprios apetrechos".
Já o comitê alega que "todo o
equipamento comprado para o
Rio-2007 foi utilizado, tenha
sido para o evento ou para o desenvolvimento do esporte brasileiro". E ainda que cedeu materiais às suas filiadas por meio
de comodato (empréstimo sem
ônus, mas que deve ser restituído no tempo combinado).
Ricardo Leyser, secretário-
-executivo do Comitê Gestor
do governo para a Rio-2016, admite que há disparidade entre o
que foi comprado e o que tem
sido usado hoje. "A discrepância entre o que adquirimos e o
que as confederações receberam existe porque nem tudo foi
dirigido pelo COB às confederações, é esse levantamento
que estamos fazendo. Se não
achamos uma bicicleta ou um
barco, temos de encontrar de
qualquer jeito, descobrir se está
com atleta, confederação...". Ou
nos depósitos do COB.
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