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BASQUETE
Banana ouro
MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE
O pai ficou tuberculoso, a
família se mudou para uma
estância climática em São José
dos Campos, os três irmãos no
banco de trás de um Ford velho.
Era a época de guerra, 1942,
1943. Racionava-se tudo, inclusive comida. O doente ganhava
uma sopa aqui, outra acolá. O
resto da família comia banana.
A casa não tinha mesa, não tinha cadeira, não tinha nada. Serviam de móvel as caixas de madeira que carregavam as frutas.
Os retirantes paulistas nunca tinham ouvido falar em basquete
na pequena São Manuel. Mas, na
cidade nova, ele era o esporte
mais popular. Não havia atalho
mais apropriado para um garoto
que desejasse se "encaixar".
Waldir percebeu e começou a
não desperdiçar os recreios. Desafiava todos do colégio. Perdia até
dos piores de 21 a 0 no "um contra
um". Ainda assim, entregava-se.
Pedalava de manhã para o clube, onde batia bola até as 11h30.
Corria para casa, almoçava e seguia para a escola. Antes de anoitecer, já estava na quadra. Intervalo só para uma banana rápida.
Alberto Marson, bronze nos Jogos de Londres-48, estava em São
José, atraído por um emprego no
Instituto Tecnológico de Aeronáutica. Para completar o orçamento, ensinava educação física.
Não demorou, tropeçou no jovem e se encantou com tamanha
obstinação. O aluno, por sua vez,
que sonhava com uma faixa de
campeão, uma loira e um Fusca,
vibrou com a consideração do
"cosmopolita" craque olímpico.
Da parceria saiu o ala-pivô
Waldir Boccardo que brilhou no
Flamengo, chegou à seleção brasileira, conquistou o título do Mundial do Chile-59 e estampou o
bronze na Olimpíada de Roma-60. E, mais importante, a semente
do treinador que, décadas mais
tarde, daria uma contribuição
fundamental ao basquete no país.
Técnico nas horas vagas já na
adolescência, Boccardo foi dos
primeiros brasileiros a buscar aulas nos EUA, a meca do esporte.
Os times brasileiros entraram os
anos 70 com uma rotina rudimentar de treinos. Exercícios calistênicos da concepção militar de
preparação física (polichinelo,
canguru, abdominal, flexão etc)
conviviam com arremessos e rachões com a bola, "para aquecer".
Boccardo foi um dos primeiros
a oferecer uma opção a essa linha
empírica. Fascinado pela literatura norte-americana sobre estrutura e dinâmica de jogo, importou um circuito de treinamento
mais sofisticado, com "drills" que
simulavam situações reais das
partidas, e proclamou um aforismo que causou furor: "quem age
leva vantagem sobre quem reage". Orientou as equipes a atacar
na defesa, a contestar a bola, a
provocar o erro adversário.
Entre os que se impressionaram
com a novidade "científica", estava Emmanuel Bonfim. Um intuitivo por natureza, o armador engatinhava na carreira de técnico.
Embora siga sua vocação "visual", Bonfim revela que sugou
teorias e métodos de Boccardo.
"Fiz só a sobremesa", reverencia o
treinador do Flamengo, time solidário que avança neste Nacional
com o espírito de Boccardo em
quadra e com a torcida do "jacu
bananeiro" na arquibancada.
Prancheta 1
A CBB imprimiu 10 mil exemplares de "Os Dez Mandamentos do
Basquete Moderno", miniguia ilustrado das idéias de Waldir Boccardo. O produto é bacana e gratuito. Mas a distribuição anda devagar...
Prancheta 2
Ary Vidal assina o prefácio do livrete. Boccardo foi seu braço direito
na campanha do bronze no Mundial das Filipinas-78, pela seleção, e
na conquista "cinderela" do Nacional-94, pelo Corinthians gaúcho.
Prancheta 3
O técnico Marcel, craque daquele Mundial-78 e partidário de uma
releitura moderna da "marcação agressiva", abre um oportuno debate sobre sistemas defensivos em seu site, www.databasket.com.br.
E-mail melk@uol.com.br
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