|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
UM MUNDO QUE TORCE
O estraga prazer
Jornalista autor de livro sobre a Copa do Chile provoca revolta ao afirmar que o país organizou o pior Mundial da história
FÁBIO SEIXAS
ENVIADO ESPECIAL A SANTIAGO
A autoestima chilena está
nas alturas. Longe de uma
Copa do Mundo desde 1998,
na França, "la Roja" lidera o
Grupo G, da favorita Espanha, a quem enfrenta hoje
num jogo aguardado com
otimismo em Santiago.
"Bravo: Vamos vencer",
escreveu ontem o jornal "La
Nación", destacando frase
do capitão da equipe, o goleiro Claudio Bravo. Já o diário
"El Mercurio" estampou na
capa elogios de personalidades do futebol, como o holandês Johan Cruyff.
Mas nem tudo é festa e harmonia no Chile da bola. Um
livro lançado no mês passado provoca polêmica.
Sem previsão de lançamento no Brasil, "1962, O Mito do Mundial Chileno", de
Daniel Matamala, defende,
em suas 495 páginas, que o
torneio de 1962 foi o pior de
toda a história das Copas.
Pronto. Foi o suficiente para causar levante de ex-jogadores, cartolas, torcedores...
Matamala, 32, é jornalista
e apresentador do canal Tele
13. E recebeu a Folha na sua
passagem por Santiago.
A capital chilena é o 14º
destino da série "Um Mundo
Que Torce".
Folha - Como surgiu a ideia
de escrever "1962"?
Daniel Matamala - Para
mim, parecia incrível que, 48
anos após o evento esportivo
mais importante da história
do Chile, nunca tivesse sido
feita uma investigação.
Em livrarias do Rio e de
São Paulo, vi estantes repletas de livros dedicados à seleção brasileira. O mesmo
acontece em lugares como
Buenos Aires e Hamburgo.
No Chile, não havia um livro
sobre 1962, muito menos um
trabalho investigativo.
Além disso, me dei conta
de que a visão que existia no
Chile sobre aquele Mundial
era muito diferente das opiniões no exterior, especialmente na Europa. Senti-me
instigado a ir atrás para saber
o quanto havia de real e de
mito naquelas histórias.
Como você recebeu as pesadas críticas que foram feitas
ao seu livro?
Todas as críticas foram feitas antes do lançamento, por
pessoas que ainda não tinham lido o livro. Pablo Dittborn, filho do principal cartola da Copa do Mundo de
1962, participou do lançamento. E recebi elogios também dos filhos de outras
duas pessoas importantes na
organização do Mundial.
Mas há vários ex-jogadores
que continuam criticando duramente o livro.
Sempre há alguns que preferem negar a verdade quando ela incomoda. Mas isso
não me preocupa. Meu trabalho é investigar, tentar me
aproximar da verdade e publicar o que encontrei, mesmo que seja uma verdade
desagradável ou incômoda.
No mundo dos esportes, que
é o mundo dos sentimentos
exacerbados e da paixão, este tipo de atitude é algo sempre esperado.
Como foi o trabalho de pesquisa?
Pesado. No total, levei oito
anos. Comecei em 2002, por
uma montanha de papéis:
atas de reuniões da Fifa, cartas, fotos, textos da imprensa
chilena e de jornais estrangeiros. Uma vez que esta papelada não me permitia ter
uma ideia mais clara do que
havia ocorrido, parti para dezenas de entrevistas.
Quais são os dados que levaram a essa conclusão de que o
Chile organizou a pior Copa
da história?
Essa minha afirmação nasceu de várias comparações
estatísticas.
Na parte da organização, o
Mundial do Chile foi muito
pobre: só quatro cidades-sedes, sendo que duas [Rancagua e Arica] mais pareciam
acampamentos, com estádios pequenos, sem alojamentos nem campos de treinamento adequados.
A presença do público
também foi triste: Tchecoslováquia e Iugoslávia jogaram
uma semifinal de Copa para
apenas 5.890 espectadores.
No campo esportivo, foi
um torneio marcado pela violência, pelas táticas defensivas e por uma média de gols
ruim [2,78 por jogo, a pior até
então]. Alguns astros da época vieram, mas, à exceção de
Garrincha, nenhum realmente jogou ou brilhou.
Texto Anterior: Greve pode elevar risco de apagões Próximo Texto: Vexame contamina até Sarkozy Índice
|