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o maratonista
Táxi em Atenas não estaciona, faz rasante e quase passa por cima do passageiro em potencial -é uma lotação de luxo, que esnoba clientes que não seguem para a mesma direção do motorista
TAXI driver
PAULO SAMPAIO
ENVIADO ESPECIAL A ATENAS
Em cinco quilômetros a caminhada passou por Glyka Nera e
está em Angia Paraskevi; depois
de um bom pedaço sem grandes
surpresas, o celular toca.
É o amigo Labros Panaioto,
confirmando para a tarde uma
outra modalidade de corrida, a de
táxi, que em Atenas exige quase
tanto preparo físico para o passageiro quanto uma maratona.
Na maior parte das vezes, é necessário ficar no meio da rua, fazendo sinal para motoristas que
nunca chegam a parar completamente o carro: fazem rasantes, e o
potencial passageiro grita para
onde vai. Se não estiver indo para
aquela região, o motorista faz cara
de desentendido e se reserva o direito de seguir sem dar nenhuma
satisfação, e a impressão é a de
que vai passar com a roda em cima dos pés de quem está lá fora.
Uma das categorias mais odiadas pelos próprios gregos, não é
difícil imaginar o que pensam os
estrangeiros dos motoristas de táxi, especialmente quando têm de
dizer alto palavras como "Mataxourgio", nome de um bairro local, e ainda por cima receber uma
acelerada como resposta.
Labros, 32, é motorista há três
anos e dirige um Seat Toledo 1997.
Ele topa a proposta da reportagem de acompanhar seu trabalho
por uma tarde. Isso só é possível
porque em Atenas, apesar de proibido, os táxis
viram lotação, levando
mais de dois passageiros
que estejam indo para a
mesma direção: quem
desce antes paga uma
fração da corrida.
"Eu tenho duas teorias
para explicar por que os
motoristas de táxi agem
assim em Atenas", diz
Labros. "A primeira é:
existem mais passageiros do que táxis na cidade. Então, como tudo na
vida, quem precisa mais
está nas mãos do outro",
resume. Ele informa que
há 17 mil táxis em Atenas, para cerca de 3,5
milhões de habitantes,
sem contar os turistas.
A segunda teoria, diz
ele, está ligada a uma particularidade da categoria: "Como a gente
transporta muita gente que nunca
mais vai ver na vida, é fácil dizer
qualquer coisa num momento de
nervosismo. Ainda mais em uma
cidade com o trânsito como o de
Atenas, que deixa qualquer um
estressado", explica o motorista,
que trabalha todos os dias, inclusive finais de semana, das 15h às
3h e roda uma média diária de 200
km: ganha 1.800 por mês.
Sua primeira passageira é a estudante Nineta Kotsary, 22, que
costuma pegar táxi duas vezes por
semana. "Não sei quanto a ele
[Labros], mas a maioria age sem
nenhuma educação, como se estivesse fazendo um grande favor",
diz Nineta, que desce dois quilômetros depois e paga 1,37.
Mais dois quarteirões e entra
um voluntário olímpico de 19
anos que, logo em seguida, divide
o banco de trás com uma mulher
de uns 30 anos, bronzeada, minivestido lilás: ela arranca suspiros
de Labros, e o faz abaixar o tom de
voz. Quando a mulher sai, ajeitando o vestido atrás, ele conta que
não é casado e se define como
"free as taxi driver":
"Uma vez transportei uma menina de uns 21 anos que estava
triste, coitadinha, indo visitar a
mãe no hospital. Conversei com
ela, a tranqüilizei e no fim ganhei
um beijo erótico", empolga-se.
Três horas depois Labros já havia transportado 15 pessoas.
Ele conta que trabalhou no porto, no aeroporto, conheceu pessoas
de todo lugar do mundo,
"mas não há experiência
como a de um motorista
de táxi". "Você faz psicanálise com todo tipo de
gente. Entra mulher
chorando, adolescente
drogado, pai de família
desempregado, prostituta. Com o tempo, você já
sabe de quem se trata só
pelo jeito como o passageiro chama o táxi. Os ricos, por exemplo, não
escolhem lugar: acham
que o táxi pode parar o
trânsito em uma avenida
movimentada só para
pegá-los", diz.
E pergunta: "No Brasil,
como é?".
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