|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FÁBIO SEIXAS
O relógio do Chico
Morto na última segunda, suíço foi o último piloto a vencer na Gávea e levou para casa um prêmio inesquecível
ERAM TRÊS os nobres europeus
na última edição do Grande
Prêmio da Cidade do Rio de
Janeiro, no "Trampolim do Diabo",
o circuito da Gávea. Dois barões, um
austríaco e um suíço, e o português
dom Fernando de Mascarenhas.
Mas a grande estrela da prova, naquele janeiro de 1954, passava longe
de qualquer título nobiliário. O ex-mecânico Chico Landi era o favorito
à vitória, ao volante de uma Ferrari.
Tudo parecia seguir o script. Landi largou na frente, manteve a ponta,
mas, na segunda volta, teve de parar
com um pneu murcho. Só voltou à
disputa dez minutos depois, sorte
diferente da maioria de seus rivais.
Traçado traiçoeiro, a Gávea engolia um a um os concorrentes. Sair vivo de choques em árvores, batidas
em postes, esbarrões em barrancos
e quetais era um troféu à parte. Muitos não o conseguiam -entre outros, o "trampolim" matou um dos
seus primeiros heróis, o petropolitano Irineu Corrêa, que em 1935 mergulhou num canal com seu Ford.
Mas voltemos a 1954... Após resolver o problema no pneu, Landi manteve-se na pista, acelerou, emplacou
uma recuperação fantástica, alcançou o terceiro lugar, mas disso não
passou. Em segundo, ficou o italiano
Giulio Musitelli, também pilotando
uma Ferrari. O vencedor, o barão
suíço Emmanuel "Toulo" de Graffenried, ao volante de uma Maserati.
Em "Circuito da Gávea", Paulo
Scali, pesquisador de mão cheia e coração sujo de graxa, relata essas histórias e conta mais. Conta, por
exemplo, que a simpatia do nobre
contagiou pilotos, mecânicos e o público. E conta um causo fantástico.
"Em 1987, o barão declararia à revista italiana "Le Grandi Automobili"
que, na cerimônia de entrega de prêmios do circuito da Gávea, um encabulado cavalheiro entregou-lhe um
relógio de ouro com a inscrição "Ao
vencedor Chico Landi'", escreve.
Graffenried morreu nesta semana, na segunda-feira. Tinha 92 anos,
morava em Lausanne e, após décadas atuando como embaixador da
Marlboro, estava aposentado. Lá fora e aqui, sites e jornais replicaram a
informação: "Morre o último remanescente do primeiro GP da F-1".
Para começo de conversa, replicaram errado. O inglês Tony Rolt, que
dividiu carro com Peter Walker, está
vivinho, aos 88. Mas não é só isso.
É emblemático que sites e fóruns
especializados em automobilismo
-que aqui tentam suprir a falta das
publicações que pululam na Europa
e muitas vezes erram feio- não tenham em nenhum instante citado
que o simpático barão foi o último
vencedor do circuito da Gávea.
Nossa memória só dura até o próximo ídolo, a próxima conquista, a
próxima tragédia, a próxima crise.
Por isso, Interlagos não conta com
um museu. Por isso, Jacarepaguá foi
dizimada. Por isso, pesquisas como
as de Scali -que também escreveu
"Circuitos de Rua", já citado na coluna- não têm apoio ou divulgação.
Por isso somos o que somos.
E nada mais.
CENA RARA
A empresa que comprou os direitos das Mil Milhas e no ano passado
revigorou a prova não conseguiu
organizar a corrida na sua data tradicional, janeiro. O evento acontecerá no final do ano, como etapa do
Le Mans Series, proibitivo para
protótipos nacionais. Menos mal
que Interlagos recebe até domingo
um belo evento com exposições e
provas de carros desde a década de
20. Ontem, o Copersucar andou
por lá. Vale a pena uma visita. A
programação está no www.classicosdecompeticao.com.br.
DOIS CENÁRIOS
Três dias de chuva e neve em Vallelunga, e tudo o que Raikkonen
conseguiu até agora foram 102 voltas, ou 417 km, com a Ferrari do
ano passado. Enquanto isso, em
Valencia, Alonso vem voando. O espanhol começou 2007 melhor.
fseixas@folhasp.com.br
Texto Anterior: Sul-Americano sub-20: Brasil vence, vai ao Mundial e está a três pontos de Pequim Próximo Texto: O que ver na TV Índice
|