São Paulo, segunda-feira, 26 de dezembro de 2005

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Futebol perde a cadência e ganha nova cara

Datafolha ajuda a explicar porque jogos hoje têm muito mais gols do que há duas décadas, quando iniciou trabalho pioneiro

DA REPORTAGEM LOCAL

Em 1985, quando o Datafolha tabulou o seu primeiro jogo, saltava aos olhos que o futebol praticado na época era muito diferente do disputado na década de 60.
Mas não existiam dados que comprovassem o que já era percebido. Apenas argumentos.
Hoje, no ano do 20º aniversário dos levantamentos esportivos do instituto, os números falam por si.
É muito mais fácil explicar o que todos observam, o quanto o esporte mais popular do planeta pode mudar em duas décadas.
O futebol atual é mais corrido e menos individualista. Aliadas a outros fatores, como a adoção, em meados da década passada, dos três pontos por vitória, essas mudanças fizeram com que a média de gols marcados disparasse.
No Brasileiro recém-encerrado, essa constatação atingiu o auge com a quebra do recorde histórico de tentos anotados no torneio.
A rede balançou, em média, 3,13 vezes por partida. Em 1986, no primeiro Nacional que contou com o acompanhamento do Datafolha, a média era de 2,09.
A artilharia cresceu no mesmo ritmo alucinante que o futebol do passado sofreu duros golpes.
Na primeira metade da década de 90, quem acompanhava um jogo assistia a cem trocas de passes a mais do que hoje.
Na principal competição do planeta, a Copa do Mundo, a adoção do estilo pingue-pongue aparece com muito mais força.
A edição de 2002, na Coréia do Sul e no Japão, ceifou 130 passes em relação aos trocados nos EUA, apenas oito anos antes.
Mas não foi só a correria em campo que tornou mais fácil a chegada ao gol. A explosão na artilharia também foi ajudada por uma marcação bem mais frouxa.
Nos anos 90, eram comuns os campeonatos que ostentavam média de 150 desarmes por equipe. O último Brasileiro terminou com quase 20 ações a menos.
A baixa não atingiu só a marcação leal. O número de faltas caiu.
A temporada 2005 terminou com uma média de 48 infrações por partida. A marca chegou a superar 55 na era Datafolha.
Nesse cenário, casos como o de Gamarra, em 1998, saltam aos olhos. O paraguaio atravessou quatro jogos da Copa da França sem anotar nem uma falta sequer. Já seria um feito e tanto.
O zagueiro, porém, conseguiu arrastar a marca por 765 minutos em partidas oficiais. A performance fez seu técnico à época, Vanderlei Luxemburgo, festejar a primeira infração. Ele temia que o pupilo "aliviasse" em alguns lances só para continuar invicto.
"Estava na melhor fase da carreira, tinha velocidade para chegar nas bolas mais facilmente. Nunca me preocupei em fazer falta ou não, mas sempre tento antecipar a jogada", afirma Gamarra.

Menos lançamentos e dribles
A nova dinâmica de velocidade e abertura em campo também mexeu em outros pontos.
Fundamentos que fizeram o nome de grandes jogadores do passado estão em baixa.
Os lançamentos longos, que consagraram Didi e Gérson, são saudosamente lembrados hoje. O fundamento já teve marcas de 13 tentativas por equipe. Em 2005, caiu quase pela metade, com 7,4.
Assistir aos craques também tem enchido cada vez menos os olhos da torcida. Até jogadas que começaram a ser tabuladas tardiamente já sentem uma queda, como os dribles, acompanhados pelo Datafolha desde 1997.
Pedaladas como as do atacante Robinho são cada vez mais lampejos. Em 1997, a média de dribles por equipe foi de 25,6. Em 2005, essa marca ficou em 16,6.
Há casos, porém, que escapam da explicação dos números e atravessam décadas desafiando regras e mudanças do esporte.
Romário, aos 39 anos, foi o artilheiro do Brasileiro deste ano.
O ímpeto para chegar aos 22 gols, apesar da idade, foi o mesmo que ele mostrava em 1994, quando levou o Brasil ao tetra.
Não à toa é um dos jogadores que, nas contas do Datafolha, mais chutou a gol nas últimas duas décadas. Apesar de o futebol de hoje ser diferente do de 1985.
A enxurrada de números é bem-vinda pela maioria dos treinadores. "O técnico pode conversar sobre o que se passou no jogo e corrigir para a próxima partida", diz Zagallo, campeão do mundo como jogador (1958 e 1962), como treinador (1970) e hoje coordenador da seleção.
Mas existem também críticos. "Quanto mais informação, melhor. Mas na hora de executar, sou prático e antigo", afirma Emerson Leão, técnico palmeirense. (MARIANA LAJOLO E PAULO COBOS)


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