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ATLETISMO
Maratonista quer viajar à Colômbia para retomar seus treinamentos
Após rotina de celebridade, Vanderlei pede dias de paz
GUILHERME ROSEGUINI
DA REPORTAGEM LOCAL
O bebê ainda não completou
um ano e parece assustado no
meio de tanta balbúrdia.
A mãe nem liga. Sorrateira, chega com o filho bem próximo ao
atleta olímpico mais badalado do
Brasil no momento e dispara:
"Pega ele no colo, por favor, que
eu preciso fazer uma foto".
Vanderlei Cordeiro de Lima, 35,
aceita o pedido sem titubear, segura a criança com cuidado e sorri quando o flash pipoca.
A cena aconteceu ontem, em
São Paulo, na primeira apresentação do maratonista após o bronze
obtido em Atenas -ele percorreu
5 km em uma corrida de revezamento, na Cidade Universitária.
O ato representa, com exatidão,
como o atleta encarou a transformação de anônimo em herói nacional desde o dia 29 de agosto,
quando superou o ataque do irlandês Cornelius Horan para chegar ao pódio na Olimpíada.
De cerimônias no Palácio da Alvorada à inauguração de farmácias no interior do Paraná, Vanderlei recebeu os mais inusitados
convites de sua carreira nesse período. E negou pouquíssimos.
"Tento fazer tudo o que me pedem. Eu juro que nada disso me
incomoda", conta o atleta.
Mesmo assim, sabe que a festa
precisa ter fim. Ontem, ao ter a
real dimensão de seu impacto
com o público, concluiu que deve
deixar o país para retornar ao cotidiano dos treinos solitários.
"Eu nunca fui tão aplaudido assim", diz, sobre a prova que reuniu mais de 30 mil competidores
-a última São Silvestre reuniu
cerca de 15 mil- e foi vencida, na
categoria para oito atletas, pelo time principal do Pão de Açucar/
BM&F. "Mas agora é hora de treinar. No início de outubro, quero
estar na Colômbia."
Ele se refere ao paraíso turístico
de Paipa, localizado a 2.600 m de
altitude. Foi lá traçou seus planos
para os Jogos na Grécia. Agora, o
refúgio pode render-lhe a paz que
ainda não achou no Brasil.
"Você acredita que ainda não
consegui relaxar no meu sítio em
Cruzeiro do Oeste [cidade paranaense onde nasceu, em 1969]?"
Ontem, pelo menos, ele pôde
usar shorts, camiseta e tênis, vestimentas de competição que já acumulavam poeira no guarda-roupa. Antes, o traje de todas as ocasiões era o terno, usado desde o
desfile de 7 de Setembro até a conversa tête-à-tête com o primeiro-ministro japonês em Brasília. "Tinha um bom estoque de roupas
sociais. Não comprei nada."
Vanderlei exibiu outras facetas
na vida de celebridade. Na última
quinta, por exemplo, deu palestra
para comerciantes em São Paulo.
Falou de planejamento. Disse
que "a estratégia é tão importante
na maratona como no dia-a-dia
dos varejistas". Ganhou aplausos.
Depois, precisou explicar se ainda sente raiva do ex-padre irlandês ("Não guardo mágoa") e se
quer encontrar Polyvios Kossivas,
o grego que o ajudou na Olimpíada ("Pretendo agradecê-lo").
Quando desceu do palco, começaram os pedidos. Um senhor de
camisa e calça preta segurou-o
pelo braço. Carregava um celular.
"Vanderlei, é a minha mulher. Fala com ela, por favor." Ele falou.
Antes de desaparecer do mapa
para encarar a próxima maratona, no início de 2005, ele relata o
episódio mais extraordinário dos
dias em que virou celebridade.
Após os Jogos, seu treinador,
Ricardo D'Angelo, tomou um táxi
em Campinas para ir do aeroporto para casa. Quando descobriu
que se tratava do técnico de Vanderlei, o motorista ligou para o
pai, companheiro de profissão,
para tirar um sarro: "Você nem
imagina quem está ao meu lado".
Duas semanas depois, na mesma cidade, Ricardo desembarcou
ao lado de Vanderlei. Entraram
em um Pointer. O comandante do
veículo abriu um sorriso ao vê-los. "Vocês pegaram um táxi aqui
há alguns dias, não pegaram?" Na
mesma hora, telefonou para o filho e devolveu a gozação.
No destino final, cobrou a corrida. Mas deu um belo desconto.
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