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BRASIL
No hotel Hyundai, equipe de Scolari "divide" concentração com o público
Com treinador linha-dura, Brasil fica mais acessível
FÁBIO VICTOR
FERNANDO MELLO
JOSÉ ALBERTO BOMBIG
SÉRGIO RANGEL
ENVIADOS ESPECIAIS A ULSAN
Paradoxos do futebol. Com Luiz
Felipe Scolari, o seu treinador
mais linha-dura dos últimos anos,
a seleção brasileira tem, em Ulsan,
na Coréia do Sul, a concentração
mais permissiva da história recente das Copas do Mundo.
O isolamento de hotéis grandiosos e exclusivos, uma constante
em Mundiais recentes, não passa
de lembrança perto do que se vê
no hotel Hyundai, o quartel-general da seleção de Scolari.
O termo militar é até exagerado
para definir os dois andares reservados à delegação brasileira na cidade coreana. Os outros oito pisos do hotel estão ocupados normalmente, por executivos, jornalistas e turistas futebolísticos.
Na Copa de 98, na França, a
equipe de Zagallo ficou confinada
num castelo em Lésigny, nos arredores de Paris, o Chateau de
Grand Romaine. Ninguém além
da delegação brasileira tinha acesso ao local. O mesmo ocorreu nas
concentrações de 94 (Los Gatos,
EUA) e de 90 (Asti, Itália).
No hotel Hyundai Ulsan, os jogadores são minoria. Ocupam
apenas 56 dos 284 quartos do estabelecimento e transitam entre
curiosos nos poucos momentos
em que não estão no seu microcosmo -o 11º e o 12º andares.
Ontem, no segundo dia da seleção no local, os sinais da concentração aberta já eram visíveis.
Logo após o treino vespertino
do Brasil, uma bola esbarrou em
várias canelas no saguão do hotel,
mas não era uma das tantas da delegação. Pertencia ao iugoslavo
Dragoje Bjelica, 30, que, de passagem por Ulsan, acompanhado de
seu amigo croata Gorah Vukic,
28, fazia plantão em busca de autógrafos no objeto de couro.
O advogado sueco Anders Luckander, 37, hóspede do hotel,
também tirou sua lasquinha.
Conseguiu apertar a mão de Cafu,
que não foi muito receptivo. "Eu
entendo. Ele deve ter que fazer isso o tempo todo, não é fácil ser
sempre simpático."
Apaixonado por futebol, o sueco tomou um susto ao descobrir
que a seleção estava em seu hotel.
"Fiquei surpreso. Achava que eles
ficariam em um resort fechado. É
estranho para eles, mas para um
hóspede como eu é ótimo."
Mal-estar
Os jogadores já começam a
achar esquisita a experiência no
hotel Hyundai. Por volta das
21h30 de ontem (horário coreano), Ronaldo desceu ao lobby para dar uma volta. Olhou para os
dois lados e só viu curiosos e jornalistas, todos mobilizados com
sua presença. Tardou um minuto
e pegou o elevador de volta à sua
"torre" no 12º -cujo corredor é
vigiado por um segurança, assim
como o do 11º.
"O problema [para os jogadores" é o que fazer quando não está
comendo ou dormindo. Num hotel fechado, ele circula livremente
e mantém a privacidade, o que
não ocorre aqui", afirma Américo
Faria, administrador da seleção.
Faria diz que a decisão de "dividir" o time brasileiro com o público já havia sido tomada pela
CBF quando ele reassumiu o cargo, em março, e que só tratou de
adaptar o grupo à nova realidade.
A escolha por Ulsan foi feita de
última hora pela entidade. Havia
a opção de ficar em Seogwipo,
mas as facilidades em relação a
treinos e locomoção eram maiores na cidade industrial, que ainda bancou (após pressão da CBF)
os pedidos feitos pelos brasileiros.
Quando tudo ficou acertado,
não havia mais hotel que pudesse
ser "fechado" para a seleção.
Além da impaciência dos atletas
pelo espaço reduzido, outro problema será a maior dificuldade
em preservar segredos internos.
Episódios cruciais da história da
seleção -como a crise nervosa
de Ronaldo em 98- estão até hoje turvados pela "caixa-preta" que
são as concentrações fechadas.
Não significa, porém, que a
simples circulação de atletas ao
lado de hóspedes e jornalistas
criará a convivência festiva e quase libertina de 82. Rigoroso quando o tema é disciplina, Scolari já
disse que preferia que os atletas
não fizessem sexo durante a Copa
e impôs uma cartilha que fixa até
horários para falar ao celular.
Ciente dos contratempos que
pode ter, ontem o técnico defendeu a opção ("Não vejo por que
eu ficar no quarto, alienado de tudo, sem bater papo com um amigo") e fez um pedido à imprensa:
"Que a gente conviva normalmente, para evitar problema".
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