São Paulo, quarta-feira, 28 de junho de 2006

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Análise

Blatter merece levar cartão vermelho

GEORGE VECSEY
DO "NEW YORK TIMES'

Seria agradável imaginar que a partida maldosa entre Portugal e Holanda foi uma aberração, pela qual podemos atribuir a culpa ao juiz. O árbitro russo está voltando a Moscou, mas os mestres do futebol continuam em seus postos, incapazes de corrigir as mensagens de violência e simulação que fazem o esporte perder prestígio. A Copa sofreu novo revés quando outro árbitro errou em sua interpretação. Fabio Grosso, da Itália, deixou-se tropeçar no corpo do australiano Lucas Neill, caído no chão. O instinto humano determinaria que Grosso saltasse sobre Neill, mas ele despencou. O juiz Luiz Cantalejo acreditou na encenação e deu pênalti. Totti fez a cobrança e marcou o gol que permitiu à Itália avançar. A encenação foi tão escandalosa que qualquer pessoa normal teria dito a Grosso, "Ah, vá!", mas os juízes perderam a capacidade de raciocínio. Apesar das ordens de punir os delitos com cartões, os árbitros não conseguem impedir que os jogadores troquem chutes ou se joguem. A culpa por essas falhas cabe à Fifa e ao seu presidente, Joseph Blatter. Questionado sobre o jogo entre Portugal e Holanda, Blatter respondeu: "Considero que, hoje, o juiz não esteve à altura dos demais participantes. Ele poderia ter recebido um cartão amarelo". Foi uma declaração engraçadinha, mas quem dirige o esporte? Blatter é um profissional de marketing que sabe como impor o nome da Fifa em cada estádio e como forçar torcedores a tirar os calções, fornecidos por marca de cerveja que não está entre os patrocinadores da Copa. Mas Blatter não demonstrou capacidade de alterar o cinismo do futebol. Chegou a hora de patrocinadores e federações decidirem que Blatter, 70, não deveria continuar. É hora de uma nova liderança, com participação maior dos jogadores. Os portugueses tiveram momentos de belo futebol, mas os estragaram com suas faltas maldosas e com a propensão a ceder a uma estranha gravidade pessoal que os fazia cair. Os holandeses jogaram sujo e perderam meu respeito ao manter a bola em jogo enquanto um rival estava caído. Em termos amplos, os dois times foram um lixo. Blatter ordenou que os juízes aplicassem mais cartões, e vejam o que isso causou: 16 cartões amarelos e o recorde de quatro vermelhos. Estou cobrindo minha sétima Copa e adoro o evento, mas consigo compreender que norte-americanos se sintam desgostosos ao assistir a alguns minutos de um jogo e perceber que os atletas seguem um código de falsidade e fingem lesões sérias. Não sou grande fã de futebol americano -as pausas entre as jogadas me incomodam-, mas admito que o esporte não recompensa um jogador que role no gramado como alguém possuído por espíritos malignos. Isso seria visto como nada másculo. Na América do Norte, o hóquei sofreu problemas devido à violência. Então as penalidades se tornaram mais severas. O basquete adota regras mais severas para coibir golpes baixos e brigas. À sua maneira, o futebol americano também tenta reduzir o número de faltas. É possível gerar mudança rápida em um esporte. Replays instantâneos são um exemplo. Os jogadores da Copa, por mais admiráveis que sejam, aprenderam a simular. No meio do meu evento esportivo favorito, tenho de admitir: isso cansa.


Tradução de PAULO MIGLIACCI

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