São Paulo, domingo, 28 de junho de 2009

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PAULO VINICIUS COELHO

O gol nosso de cada dia


A passagem de Keirrison pelo Palmeiras relembra a de Luizão, não só no sucesso mas também no fechamento


OBSERVE BEM os últimos gols de Keirrison no Parque Antarctica. Eles foram marcados contra o Cruzeiro, há duas semanas. O primeiro foi gol de placa, e o segundo decretou a vitória por 3 a 1. Nem em um, nem em outro, o centroavante correu para comemorar com a torcida.
Uma semana antes, a arquibancada do Palestra Itália não o perdoou pela má atuação contra o Vitória. Substituído aos 28min do segundo tempo, ouviu vaias e decretou em sua cabeça de jovem craque: queria ir embora o mais rápido possível.
Não cobre de Keirrison a percepção de que alguns gênios viveram altos e baixos até mesmo em clubes onde fizeram história. Em 1980, parte da torcida do Corinthians invadiu o vestiário disposta a agredir Sócrates, depois de uma derrota para o XV de Piracicaba. Craque no futebol e na vida, o Doutor virou o placar.
Keirrison não é Sócrates. Na quarta, pediu aos jornalistas que parassem de fazer perguntas sobre transferências. Na sexta, viajou a Curitiba, arrumou as malas e avisou ao Palmeiras que não pegaria o Santos. Há aspectos a ponderar dessa história. O primeiro foi tratado por Luizão, em entrevista à ESPN Brasil.
Em 1996, aos 20 anos, a mesma idade de Keirrison, Luizão iniciou sua trajetória pelo Palmeiras com dez gols em oito jogos oficiais, números iguais aos de Keirrison. Na reta de chegada do Paulista, foi vaiado, apesar de campeão e de marcar no jogo do título, contra o Santos. O motivo, a escassez de gols e a perda da artilharia para o santista Giovanni. "A torcida do Palmeiras é muito chata", declarou Luizão, quando questionado sobre as críticas a Keirrison.
A história de Keirrison parece a refilmagem da de Luizão no Parque Antarctica. Chegaram com a mesma idade, surgiram com o mesmo sucesso, sofreram as mesmas críticas, terminaram no mesmo destino suas passagens pelo Palmeiras. Luizão foi para o La Coruña, Keirrison vai para o Barcelona ou, provavelmente, para o Valencia, em negociação triangular. Os dois se queixam da relação turbulenta com uma das torcidas mais exigentes do país. Ou, como disse Luizão, uma das mais chatas.
A exigência, ou chatice, tem tudo a ver com a falta de grandes times, de grandes títulos. Ausências relacionadas atualmente com a falta de independência do departamento de futebol. Na sexta-feira de manhã, o vice-presidente Gilberto Cipullo dizia que Keirrison só sairia se houvesse consenso entre o clube e a parceira. À tarde, ficou evidente que, por 16 milhões, o Palmeiras seria obrigado a aceitar a transferência.
Exigência dos representantes do jogador, mais do que da Traffic.
Keirrison queixou-se também da relação com Luxemburgo. Em dezembro, dizia sonhar com o Palmeiras, para trabalhar com o técnico que fez brilhar dezenas de jogadores. Alex, Rivaldo, Edílson, Marcelinho... Lembrava quantos foram os que viveram suas melhores fases com ele. Em junho, se vai lamentando as vezes em que o técnico apontou para os jogadores os problemas do time. Luxemburgo já pediu desculpas ao elenco, a torcida já fez as pazes com ele. Keirrison vai, porque é reflexo da nova versão de nosso complexo de vira- -lata: ninguém mais acredita que aqui se jogue futebol em alto nível.

pvc@uol.com.br


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