São Paulo, segunda-feira, 28 de outubro de 2002

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FUTEBOL

Mercadores de ilusões

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

"Se macumba valesse, campeonato baiano terminava empatado." Lembrei desse sábio dito popular ao ler a não menos sábia declaração de Dodô, sobre as rezas e "despachos" que os palmeirenses estão fazendo para o time não ser rebaixado.
"Temos é que trabalhar, treinar. Tem filho de Deus nos outros times também", disse o atacante. Claro que muitos torcedores poderão responder que o próprio Dodô não trabalha e não treina o quanto devia, mas essa é outra história.
O fato é que o futebol, por excelência um terreno de sonhos, esperanças e desesperos, é um campo fértil para os aproveitadores, sejam eles pais-de-santo, gurus de auto-ajuda ou pastores neo-evangélicos.
Nada contra a fé, os sinais-da-cruz, os amuletos, entrar com o pé direito, beijar a medalhinha etc. Sempre defendi o aspecto ritualístico do jogo e creio que cada indivíduo tem o direito de buscar sua via pessoal de contato com o sagrado, seja ela qual for.
O problema é que muita gente tira proveito disso, vendendo uma espiritualidade "fast food" ou fórmulas de sucesso a preços módicos. Contra essas múltiplas formas de picaretagem, toda atenção é pouca.
O curioso é que, em momentos de desespero -como o que o Palmeiras atravessa-, a busca religiosa frequentemente convive com seu oposto, ou seja, a perspectiva bem pragmática e materialista de uma mudança nas regras. Uma via amoral (para não dizer imoral) de salvação.
A diretoria do Palmeiras assegura que o clube acatará um eventual rebaixamento. A torcida também, até porque a humilhação de protagonizar uma "virada de mesa" é quase tão grande quanto a de cair para a Série B.
Mas, pelo que tenho visto, há muitos torcedores palmeirenses torcendo para que um grande clube carioca (Vasco ou Flamengo, de preferência) fique também entre os quatro rebaixáveis -situação em que, segundo acreditam, a lambança seria inevitável.
Nesse caso, o Palmeiras poderia se beneficiar da marmelada de modo, digamos, "passivo", sem ter de assumir o ônus da responsabilidade.
Claro que os palmeirenses mais sérios rejeitam essa alternativa, pois percebem que ela seria uma peneira incapaz de tapar o sol.
Resta-lhes, portanto, o caminho mais difícil e exigente: a esperança numa conjunção improvável de resultados -sem a muleta da religião, ou os golpes dos cartolas.
E a esperança -no futebol, assim como na política ou na vida amorosa- não é um sentimento fácil de carregar.
"Peso mais pesado/ não existe não" (Manuel Bandeira).
Em situação oposta à do Palmeiras estão seus grandes rivais, São Paulo, Santos e Corinthians. Com mais base na intuição e no bom senso do que na fria lei das probabilidades, penso que os três terão lugar na próxima fase, ao lado de Juventude e São Caetano.
Claro que pode haver surpresas. Matematicamente, nem o líder São Paulo está garantido.
Mas, ao que tudo indica, a briga de foice mesmo será para definir os três outros classificados.
Pelo menos 12 clubes têm chances reais de lutar por uma dessas vagas: Atlético-MG, Grêmio, Vitória, Guarani, Fluminense, Ponte Preta, Coritiba, Figueirense, Atlético-PR, Goiás, Lusa e Internacional.

Vitórias dos líderes
Na rodada de anteontem, o São Paulo confirmou sua boa fase atropelando a Lusa sem dó, e o Santos espantou a ameaça de crise despachando o Fla para as redondezas da zona de rebaixamento. Mas a vitória mais espetacular foi a do Juventude, que virou o jogo depois de estar perdendo em casa por 2 a 0 para o valente Figueirense. Uma virada assim dá moral ao time para brigar pela liderança.

Kluivert tricolor
Luís Fabiano era dúvida para São Paulo x Lusa. Acabou fazendo dois gols e perdendo outros tantos. Às vezes fica ofuscado pelas estrelas do time, mas é um excelente atacante, que lembra um pouco, pelo porte e pelo estilo, o holandês Kluivert. Ambos têm domínio de bola e visão de gol, atuando tanto de pivôs como de finalizadores. A diferença é de nível. Kluivert está uma ou duas escalas acima.

E-mail jgcouto@uol.com.br


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