São Paulo, terça-feira, 29 de maio de 2007

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SONINHA

Não são biônicos

Por mais ricos que estejam, jogadores não são infalíveis, onipotentes ou inesgotáveis; Kaká é um belo exemplo

NAS ÚLTIMAS semanas, Kaká foi o jogador "estrangeiro" (brasileiro no exterior) mais comentado por aqui. Primeiro (2/5) por ter se saído melhor do que Cristiano Ronaldo, destaque da temporada, na semifinal da Copa dos Campeões. Depois (11/5) porque pediu dispensa da seleção que disputará a Copa América, alegando cansaço. Em seguida (17/5) Kaká foi convocado para os amistosos contra Inglaterra e Turquia. No capítulo mais recente (23/5), o jogador revelado pelo São Paulo foi artilheiro e campeão daquele que é o principal torneio de clubes da Europa (e, reconheçamos, do mundo).
Por partes: Kaká foi decisivo para que o Milan derrotasse o Manchester de Ronaldo. Mas esse jogo não pode ser a "prova" de que o jovem português (de 22 anos!) é uma farsa, "amarelão", puro marketing ou outras bobagens que as pessoas dizem quando se decepcionam com alguém -muitas vezes, por excesso de expectativa... Cristiano Ronaldo é um grande jogador. Um pouco mascarado, ainda imaturo? Possivelmente. Mas Kaká também já foi considerado um "fracasso"... E ainda seria se uma bola não batesse em Inzaghi e entrasse, e ele não acertasse a outra no gol. Tivesse o Milan perdido para o Liverpool, não faltaria quem dissesse que Kaká "não está nem aí para o futebol", que "não é tudo isso", ou que "afina na hora H". Em várias ocasiões, no São Paulo, o meia foi o melhor do time, talvez até o melhor em campo, mas não saiu com vitória e teve de ouvir comentários do tipo "mais uma vez, sumiu na partida".
Proferidos, às vezes, por quem não viu o jogo e apenas analisou grosseiramente as estatísticas ou as imagens dos melhores momentos. Ao se queixar da falta de descanso nos últimos anos, Kaká foi alvo de ataques outra vez, junto com Ronaldinho Gaúcho. Mascarado, acomodado, "pensa que está garantido?", antipatriota. Como se tirar férias todo ano fosse um luxo a mais na vida de quem já tem tudo. Por mais ricos que estejam, jogadores de futebol ficam exaustos. Dinheiro não os torna invulneráveis, biônicos. Não há fortuna que substitua um período de distância do trabalho (treinos, jogos, mídia) e de convivência tranqüila com a família, longe das pressões que apenas imaginamos. O torcedor se envolve emocionalmente com uma partida, sofre, grita, pode até ficar abalado por horas ou dias, mas logo vai fazer outra coisa da vida.
O jogador fica sendo quem é o tempo todo. O que errou o chute, o que não conseguiu acompanhar o adversário, o que sofreu a falta dura e sente dor. Não adianta comparar obrigação e lazer, por mais que o trabalho seja legal. Nos meus tempos de MTV, várias vezes me arrastei até um show a que precisava assistir quando o que mais queria era ir para casa dormir.
Às vezes música cansava tanto que eu ficava incomodada com qualquer som ligado, mesmo que fosse minha banda favorita. Jogar na várzea é bom, mas quem gostaria de ser obrigado a (e cobrado por) isso? Até outro dia, Kaká e Ronaldinho eram "dispensáveis". Agora querem contar com eles de qualquer jeito? Eu só os quero inteiros, tinindo, no auge do vigor físico e técnico. Que façam boa apresentação contra Turquia e Inglaterra e voltem depois.

soninha.folha@uol.com.br


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