São Paulo, quinta-feira, 29 de junho de 2006

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José Geraldo Couto

Nunca está bom

Não surpreende a torcida cobrar a seleção, e sim ficar inerte sobre o país

FOI MEU amigo Mauricio Stycer, editor da revista "Carta Capital", quem chamou minha atenção: "Já reparou como somos exigentes com a seleção brasileira? Vencemos as quatro primeiras partidas, e, mesmo assim, ninguém está satisfeito". É a pura verdade. Existe um contraste entre o oba-oba da TV e o sentimento de insatisfação dos torcedores com a equipe de Parreira. Isso se vê (ou se ouve) nas ruas das cidades brasileiras e também nos estádios alemães. Você já viu uma torcida menos entusiasmada e solidária com seu time do que a brasileira? As outras seleções podem estar empatando a duras penas, podem estar ganhando feio, podem estar até perdendo, e as suas torcidas estão lá, cantando hinos, entoando gritos de guerra, apoiando, incentivando. A do Brasil parece se manifestar só na hora do gol e quase que por obrigação. Isso quando não vaia. Para nós, nada está bom. Ganhar de pouco é ultrajante, fazer gol feio ofende. E sempre brandimos a ameaça: se o próximo rival jogar um pouco melhor que o anterior, adeus. Não me entenda mal. Sou um dos primeiros a falar mal de nossas atuações, a cobrar um futebol mais solto e bonito. Estamos aqui para isso. Mas não deixa de ser interessante pensar nisso: o brasileiro, que convive mais ou menos passivamente com a humilhante concentração de renda, com a escandalosa corrupção, com a alarmante violência, com o precário saneamento básico, com ônibus lotados, filas em hospitais, falta de moradia e uma infindável série de etc, não tolera uma exibição medíocre da sua seleção de futebol. Por que acontece isso? Talvez porque no futebol, a despeito de nossas grandes realizações (cinco Copas não são pouca coisa), fique mais claro que em qualquer outro departamento que poderíamos ir ainda mais longe. Esse alto grau de exigência não é estranho. Estranha é a aceitação passiva de tudo o mais que nos cerca. Nas outras modalidades da vida, não passaríamos das eliminatórias.

jgcouto@uol.com.br


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