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FUTEBOL
"Coração de passarinho" de sedentário que não faz avaliações é mais sujeito a problemas como o de Serginho
Esporte mata mais atleta domingueiro, afirmam médicos
FÁBIO SEIXAS
DA REPORTAGEM LOCAL
Mortes súbitas de atletas profissionais ainda surpreendem médicos e especialistas do esporte. O
que não choca nem espanta são
casos com esportistas eventuais.
Peladeiros de final de semana,
crianças em aulas de educação física ou maratonistas de ocasião
estão mais sujeitos a problemas
como o que matou o zagueiro Serginho do que atletas regularmente
submetidos a avaliações médicas.
Isso já foi analisado e comprovado por estudos. E essa é a opinião unânime de profissionais da
área ouvidos ontem pela Folha.
"Não há dúvida de que o risco
de morte súbita em um esportista
eventual é muito maior do que em
alguém que vive disso. A grande
maioria das pessoas, infelizmente, entra no esporte sem se submeter a nenhum exame ou avaliação. Esses atletas de fim de semana não se conhecem", disse Marcelo Leitão, diretor da Sociedade
Brasileira de Medicina do Esporte
e desde 99 responsável pelas avaliações cardiológicas do CPB, o
Comitê Paraolímpico Brasileiro.
O médico citou um estudo feito
nos EUA que mostrou uma incidência de morte súbita de 1 para
200 mil entre atletas escolares
com idades de 12 a 20 anos. Outra
pesquisa mostrou uma ocorrência maior de enfarte no período
da manhã em corredores sem
acompanhamento especializado.
"Há dois problemas nos casos
das pessoas que começam a fazer
esporte de uma hora para outra.
Elas obviamente não estão preparadas e não sabem de sua condição", disse o cardiologista Ari Timerman, especializado em emergência e ressuscitação cardiopulmonar e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia.
Para o professor de educação física José Rubens D'Elia, que atua
com atletas de ocasião em empresas e condomínios, o problema é
que muitas dessas pessoas têm
medo de se submeter a exames.
"Muitos desses atletas se acovardam, têm medo de ver o
check-up e então preferem simplesmente não fazer nada e saem
correndo por conta própria",
contou. "Com criança, então, é
preciso um cuidado maior. A estrutura do coração ainda está sendo formada e muitos pais se empolgam e colocam as crianças para correr provas longas ao lado
deles. Isso é perigosíssimo."
A questão é tão preocupante
que, na semana que vem, a Sociedade Brasileira de Medicina do
Esporte lançará suas "Diretrizes
sobre Morte Súbita no Exercício e
no Esporte", primeiro documento do gênero publicado no país.
"As pessoas confundem e
acham que a gente vai proibir a
prática do esporte. Não é nada
disso. No máximo, podemos direcionar o atleta para um esporte
mais adequado à sua condição",
declarou Ricardo Najas, presidente da sociedade. "Mas o risco de
morte súbita em atletas eventuais,
sem acompanhamento, é maior."
Vanderlei Pereira, professor de
educação física e dono de uma
empresa da área de fisiologia do
esporte, é mais enfático. "Até um
prova de recreação ou um teste de
cooper são perigosos para um sedentário. O cara que passou anos
trancado no escritório não tem o
coração adaptado. É como o coração de um passarinho, reduzido,
com cavidades muito pequenas."
Nos anos 80, o assunto foi tema
de um livro polêmico, "Esporte
mata", do cientista José Róiz.
"Todos os esportes são nocivos.
Em Pará de Minas, minha cidade
natal, estão construindo quatro
ginásios. Que mal fizeram a Deus
os jovens de minha terra para merecer esse castigo? A intenção de
levar os jovens a praticar esporte
para afastá-los das drogas é o
mesmo que prestar culto ao diabo
para não ir para o inferno", escreveu Róiz, defendendo que "dar
preferência ao desenvolvimento
muscular antes dos 25 anos acarretará atraso no desenvolvimento
de todos os outros órgãos."
Leitão rebate. "A gente não pode entrar agora nessa paranóia de
achar que o esporte faz mal, porque essa é uma grande mentira.
As pessoas precisam é se concientizar da importância de um acompanhamento médico correto."
D'Elia tem um palpite sobre o
que acontecerá agora, a partir da
morte do jogador do São Caetano.
"Dá para imaginar que os consultórios dos cardiologistas vão lotar.
Que isso salve algumas vidas."
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