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FUTEBOL
Justiça poética
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
O Cruzeiro tem grandes
chances de se tornar campeão nacional amanhã, pela primeira vez.
Pela primeira vez? Sim e não.
Embora nunca tenha vencido o
Brasileiro propriamente dito, desde que este torneio foi instituído
em 1971, o clube mineiro conquistou quatro vezes a Copa do Brasil,
além de ter faturado espetacularmente em 1966 a Taça Brasil, o
torneio nacional da época.
Ou seja, títulos de expressão nacional não faltam na carreira do
Cruzeiro. Ainda assim, a ausência de um troféu de campeão brasileiro doía mais que o retrato de
Itabira na parede de Drummond.
Essa lacuna está prestes a ser
preenchida.
Há uma série de rimas e simetrias no título histórico que talvez
venha amanhã.
Em primeiro lugar, o concorrente direto pelo título deste ano é
o mesmo de 1966, quando o Cruzeiro despontou para a glória
com um esquadrão inesquecível.
Estou falando do Santos, claro,
que há 37 anos tinha Pelé, Toninho Guerreiro e Edu e que hoje
tem Diego, Robinho e Renato. No
time azul, onde antes despontavam Tostão, Dirceu Lopes e Piazza, hoje brilham Alex, Maurinho
e Aristizábal. Os anos passam, os
grandes times permanecem -ao
menos na memória encantada
dos torcedores.
Outra simetria: na Taça Brasil
de 1966, Cruzeiro e Santos se enfrentaram duas vezes -uma no
Mineirão e a outra na Vila Belmiro- e em ambas o clube mineiro
venceu.
No atual Brasileiro, a história se
repetiu: duas vitórias azuis, nos
mesmos dois palcos. E há quem
diga, com muita razão, que foi
nessas duas partidas cruciais que
se decidiu o título deste ano. Afinal, se tivesse vencido uma delas,
o Santos estaria hoje empatado
com o líder.
Mas há outra justiça poética em
andamento. O primeiro a vencer
o Brasileirão, em 1971, foi justamente o maior rival do Cruzeiro,
o Atlético-MG, o que tornava o jejum cruzeirense ainda mais doloroso para seus torcedores.
A partir de amanhã, talvez eles
fiquem livres desse motivo de
zombaria atleticana. Os dois
grandes clubes mineiros vão ficar
rigorosamente empatados na história do Brasileirão, uma vez que
cada um deles contará com um título e três vice-campeonatos.
Para quem não torce para clube
nenhum, isso poderá parecer fútil.
Mas, para quem tem na ponta da
língua a escalação de seu time nos
jogos históricos, para quem sabe
quem fez os gols decisivos, para
quem lamenta até hoje o pênalti
perdido há décadas ou a bola que
bateu na trave, tudo isso é memória viva, que dá sentido ao presente e ânimo para o futuro.
Cada torcedor carrega consigo
a história de seu clube, "como os
reis levam coroas/ e as mães carregam seus filhos/ e o mar o seu
movimento/ e a floresta seus aromas" (Que me perdoe Cecília
Meireles pela apropriação
indevida).
O torcedor não vive no passado.
Como diria Paulinho da Viola, é
o passado que vive nele. Seu tempo é hoje.
Na marca do pênalti
Suspense na rabeira da tabela
do Brasileiro. Grêmio e Bahia,
dois times que já conquistaram
o título de campeão brasileiro,
estão na marca do pênalti no
que diz respeito ao rebaixamento para a Série B. Qualquer
tropeço, já era. E o curioso é
que o destino de ambos pode
estar nas mãos de dois clubes:
Corinthians e Criciúma. Este
último enfrenta em casa amanhã o Grêmio e no próximo domingo, também em Santa Catarina, o Bahia. Já o Corinthians
joga amanhã contra o Bahia
(em São Paulo) e na última rodada contra o Grêmio (em Porto Alegre). O detalhe é que tanto o Criciúma quanto o Corinthians já não têm nada mais a
ganhar nem a perder neste Brasileiro. Resta saber qual dos
dois tem mais vocação para
carrasco.
E-mail jgcouto@uol.com.br
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