São Paulo, quarta-feira, 29 de dezembro de 2004

Texto Anterior | Índice

FUTEBOL

Santa impaciência

JORGE KAJURU
ESPECIAL PARA A FOLHA

Não é somente o insubstituível colunista Tostão que está sem paciência com tantas coisas do futebol. Existe uma nação de torcedores do bem que também não suporta mais ver tanta incompetência e roubalheira (Tostão, mais equilibrado, preferiu definir como falta de transparência) de muitos dirigentes.
Há uma outra nação, infelizmente menor, de jornalistas que perderam a paciência com tantas patotas nos clubes, nas federações, na CBF, na crônica esportiva, nos governos. Como discordar de Tostão quando diz que há pequenas e grandes patotas, que representam quase o pensamento único? As pessoas de uma turma só escolhem e elogiam os que fazem parte ou têm algum vínculo com a mesma turma. O Brasil é o país das patotas. Costumo exagerar que em breve as pessoas éticas vão ser linchadas neste mundo onde o errado é que parece certo.
A minoria que condena a parceria do Corinthians está errada? Lavada ou não, então vamos questionar a grana que entra e sai de vários outros clubes, com parceiros de origem bem duvidosa. Mas como profetiza Hailê Sallassiê, eterno dirigente do Goiás, o futebol é um prostíbulo, não tem espaço para virgens. Paciência, até porque temos assuntos mais sérios. Num país onde não se debate e nada se decide para valer sobre o tráfico, que virou perspectiva de ascensão social. E, quem diria, um governo do PT que não encara esse problema gravíssimo.
Tudo em nome de Jesus, o do PL. Assim segue o fluxo. De repente é pura tolice criticar fatos extracampo. O que interessa é o espetáculo! Aliás, quando acabou o jogo Santos x Vasco e se comemorava o justíssimo título conquistado pelo time paulista, o que se falava na transmissão da Globo? Que o Vasco jogou com dignidade. Que, mesmo sem Petkovic, não interessava nem tinha importância saber se o craque não jogou por vontade própria ou por decisão do Vasco. Santa paciência. Pobre jornalismo comercial. E quando entrou Faustão: "Viva o Peixe do Marcelo Teixeira, esse grande presidente...". O que fazer, rir ou chorar?
Numa entrevista sobre o livro de Memórias de Roberto Marinho, a viúva Lily Marinho disse que o Roberto colocou o Collor na Presidência e depois tirou. O que dizer? Paciência. Solução não seria desligar a TV na hora do futebol ou assistir só com a imagem, sem áudio. Escolheria um som alheio ao esporte. Uma jóia rara como Tom Jobim ao vivo, em Minas. Ah! Quanta saudade de João Saldanha, meu maestro soberano, no submundo do futebol. Volte logo das férias, pois como você mesmo, Tostão, escreveu antes do Natal de 2003, hoje em dia o importante não é fazer bem, e sim vender bem. Às vezes, percebendo ou não, vende-se a alma. E quem não aparece não se vende, não tem prestígio nem fatura. Aí está o mundo moderno ou pós-moderno, onde vende-se de tudo, principalmente a própria imagem.


Jorge Kajuru, 43, é jornalista

O colunista Tostão está em férias


O que faço?
Justifico minha existência como jornalista mantendo distância cética de quaisquer poderes. Me divirto bastante no interior, não sendo cordeirinho de nenhum veículo, e de vez em quando tenho o privilégio de ocupar a coluna de Tostão e poder escrever o que penso com rara liberdade para os tempos atuais. E ainda sou pago.

Conselho do Felipão
"Kajuru, meu amigo, escute quem gosta de ti. Quando tu voltares à mídia nacional, esqueça essa gente toda. Eles vão continuar existindo e roubando do mesmo jeito."

Conclusão
Não vou consertar o mundo, mas também não vou deixá-lo me desconsertar.

E-mail
jorgekajuru@terra.com.br


Texto Anterior: Tênis - Régis Andaku: Foi!
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.