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FUTEBOL
O dia em que o Che pegou um pênalti
MÁRIO MAGALHÃES
COLUNISTA DA FOLHA
No fim de uma tarde dominical de junho de 1952, o goleiro e técnico de futebol Ernesto
Guevara de la Serna perfilou-se
para a execução do hino da Colômbia. Abaixou-se para limpar o
sangue em um joelho. Ferira-se
nos vôos acrobáticos com que
obrara o milagre de levar o Independiente Sporting à decisão do
torneio daquele dia.
Um coronel destemperou-se
com o que considerou desrespeito
do argentino de 24 anos de idade.
Ralhou e mandou que levantasse.
Guevara preparou-se para reagir.
Lembrou que tinha uma passagem aérea a receber, além de alguns trocados. Deixou para lá.
Chegara havia menos de uma
semana àquele fim de mundo de
nome Leticia, cidadezinha xifópaga da brasileira Tabatinga.
Com Alberto Granado, alcançara-a de balsa, depois de se perder
no rio Solimões. Meio ano antes,
por aqui com o curso de medicina, Guevara topara a proposta do
amigo mais velho: partir para
uma aventura latino-americana
a bordo de uma motocicleta de
500 cilindradas. Ao bater em Leticia, já não tinham moto alguma.
Na verdade, não tinham nada.
Sem dinheiro, ofereceram seus
préstimos de médicos, ou quase
isso. Queriam passagens de avião,
gratuitas, para Bogotá. Em dois
dias, ouviram a oferta: casa, comida, roupa lavada, bilhetes com
desconto e um dinheirinho para
treinar o time no qual ninguém
levava fé. Caiu do céu. O Uruguai
era campeão mundial. O Brasil,
vice. Mas os craques, poucos duvidavam, nasciam na Argentina.
Ernesto e Alberto dividiram o
comando. Num treino domingo
de manhã, o primeiro apitou, e o
segundo dirigiu a equipe. Levaram 2 a 0, e não teve jeito. Teriam
que jogar. Havia um problema, a
saúde de Guevara. Na umidade
amazônica, a asma voltara a incomodar. Na linha, não daria.
Menos mal que Granado era um
estilista do meio-campo. Tão elegante que os colombianos apelidaram-no Pedernerita, referência
ao genial futebolista argentino
Adolfo Pedernera.
Cinco equipes jogaram na "cancha popular", rodeada pela selva.
Na primeira partida do Independiente, Granado deixou o seu.
Venceram. Na segunda, Guevara
fechou o gol. Jogava adiantado,
lembraria seu amigo numa longa
conversa que tivemos por telefone. Na época, goleiros ainda se
mantinham embaixo do travessão. Com o 0 a 0, passaram à final
porque tiveram mais escanteios a
favor.
Na decisão, outro empate. Nos
pênaltis, Guevara pegou um, mas
o time perdeu. O goleiro escreveu
à sua mãe: "Defendi um penal
que vai ficar na história de Leticia".
Lembrei o episódio por causa do
filme "Diários de Motocicleta", de
Walter Salles. Conta a viagem dos
amigos argentinos. Não sei se o
pênalti chegou à tela. Assim que
estrear, vou correndo assistir. Em
1997, nos 30 anos da morte do revolucionário que em Cuba virou
"El Che", viajei a Leticia para
contar como fora o campeonato
relâmpago. Na hora de titular,
mandei de bate-pronto: "Che:
bom de bala, bom de bola".
Saldanha na tela
Nilton Santos e Apolônio de
Carvalho serão entrevistados
semana que vem pelo cineasta
André Iki Siqueira. São os primeiros dos 50 personagens a
serem ouvidos para o documentário sobre João Saldanha.
O longa-metragem deve se chamar "João, uma vida em jogo".
A última do Pelé
Vai bem o Corinthians, favorito
do Brasileiro em mais uma previsão do Edson.
Ainda é cedo
Os 4 a 1 da seleção não querem
dizer muita coisa. Valeu o brilho de Ronaldinho e Kaká. Se a
parelha Juninho Pernambucano e Edmílson der certo contra
um adversário de peso, Parreira
terá feito seu maior achado na
volta à seleção.
E-mail
mario.magalhaes@uol.com.br
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