São Paulo, sábado, 30 de outubro de 2010

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RITA SIZA

Arroz de polvo


Aparentemente, antes de morrer, o polvo Paul vaticinou que a Inglaterra seria a sede da Copa-18

NOS ANOS 80, a televisão pública portuguesa passava uma série italiana, brilhante, sobre a máfia. Chamava-se "O Polvo" e impressionava o país de tal maneira que, tal como o futebol, era motivo de discussão nos cafés e autocarros. No centro da acção, estava um comissário da polícia atormentado, um justiceiro que chegava à Sicília vindo de Milão e que, apesar de todos os esforços, acabava ultrapassado pela sofisticação e diversidade do crime organizado, cujos tentáculos tocavam o mundo da política, das finanças, da administração e da Justiça.
Nesta semana, a Fifa vestiu um traje parecido com o do tal comissário Corrado Cattani e, mais uma vez, propôs-se a enfrentar a corrupção e repor a ordem. Como o personagem italiano, os senhores que olham pelo futebol têm tarefa difícil. Eles não têm que lidar só com um polvo, mas com muitos, como aprendemos após o jornal britânico "Sunday Times" ter publicado provas do "sistema" em funcionamento: vários membros do Comité Executivo da Fifa foram filmados a pedir dinheiro para votar favoravelmente num dos candidatos à organização da Copa do Mundo de 2018.
Os representantes da Nigéria e do Taiti, expostos pela câmara oculta, foram imediatamente suspensos, assim como quatro outros responsáveis, cujos nomes foram divulgados pela Fifa, que se escusou a precisar as razões para que a medida fosse tomada (disseram-nos que foi por "violação dos regulamentos", e mais nada).
Depois ficamos a saber que, afinal, a Fifa estava a investigar, por suspeitas de subornos e corrupção, uma série de candidatos. A Rússia apresentou uma queixa contra a Inglaterra alegando irregularidades, e uma outra gravação indiscreta denunciou um suposto acerto da candidatura ibérica Portugal/Espanha com o Qatar, qualquer coisa como "nós garantimos-vos os votos para o campeonato de 2018 e vocês garantem-nos os votos para o Mundial de 2022". Como são compridos esses tentáculos...
Para resolver o imbróglio, a Fifa bem que podia aproveitar a solução providenciada pelo polvo Paul, inacreditável celebridade que todos os seguidores do futebol conhecem e que, aparentemente, antes de morrer, vaticinou que seria a Inglaterra a organizar a Copa de 2018. Uma previsão que corre o risco de falta de isenção, uma vez que o animal era proveniente de águas britânicas. Polvo por polvo, talvez seja melhor recorrer ao Paul 2º, que já está a caminho do aquário alemão de Oberhausen e que, nos garantem, tem os mesmos dotes divinatórios do seu precedente. E é francês. Se não der certo, podem usá-lo para cozinhar um belo arroz. Tendo em conta a terra donde vem, o repasto deve ficar delicioso.


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