São Paulo, domingo, 30 de novembro de 2008

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Corrida pára futebol em Paraisópolis

Prova inédita, com 500 participantes, tem largada hoje em campinho de terra, atrasa jogos e quebra rotina em favela

Circuito Popular, com três etapas, dá a comunidade carente chance de correr evento similar aos que ocorrem em áreas nobres


ADALBERTO LEISTER FILHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Hoje será uma manhã diferente para Alfredo de Carvalho, 47. Entusiasta de provas de rua -seu melhor tempo na São Silvestre é 1h18min-, irá participar, pela primeira vez, de uma competição em Paraisópolis, local onde reside há 11 anos.
"Não estava sabendo. Um amigo me avisou. Quase não consigo inscrição", conta o garçom, que trabalharia hoje até 1h em uma churrascaria.
Corridas de rua em São Paulo, cada vez mais badaladas e freqüentes, atraem os mais abastados a locais como Ibirapuera, USP ou parque Villa-Lobos. Em uma favela, porém, a história é um pouco diferente.
Em Paraisópolis, são duas voltas em circuito que totaliza 4 km. Apesar da distância menor que os habituais 10 km, o percurso tem outras dificuldades. Subidas e descidas esburacadas, em vias asfaltadas ou de terra, são o maior desafio.
Nada disso desanima a população que abraçou o evento e praticamente zerou as 500 vagas disponíveis. A prova, por sinal, já quebra a rotina da favela.
"É a primeira vez que temos um evento desses. Atrasamos os jogos no campo do Palmeirinha", conta Gilson Rodrigues, presidente da União dos Moradores de Paraisópolis, referindo-se ao campinho de terra onde será a largada hoje, às 9h.
A prova abre o Circuito de Corridas Populares, que ainda terá etapas em Heliópolis, também na zona sul de São Paulo, e Recanto das Emas, em Brasília.
A idéia de realizar a corrida em um local alternativo, atraindo um novo público, surgiu em 2007, quando foi organizada a primeira prova de Heliópolis, maior favela de São Paulo.
"O que a gente quer é levar o esporte para comunidades, que são carentes de iniciativas como essa. A prova terá toda a infra-estrutura de uma grande corrida, com camiseta de tecido tecnológico, chip, medalha, premiação, água e isotônico", enumera Hélio Takai, diretor da HT Sports, a organizadora.
Embora tenha um centro comunitário atuante, Paraisópolis enfrenta problemas sociais graves, como o índice de 22,6% de desemprego, segundo dados da Secretaria Municipal de Habitação. Para diminuir esses números, a União dos Moradores montou programa de qualificação profissional. "Já colocamos 1.115 pessoas no mercado de trabalho com carteira assinada", contabiliza Rodrigues.
A idéia, com a corrida de hoje, é também intensificar as opções de lazer, mesmo que a prova seja restrita a atletas com mais de 16 anos, o que não é empecilho aos mais jovens.
"Formei uma turma de garotos de 14 a 17 anos. Arrumei inscrição para os mais velhos, mas os outros também correrão", diz Juracy Almeida, convidado para ser coordenador de esportes da União dos Moradores.
Ex-corredor, Almeida deixara de competir havia sete anos e voltou aos treinos para o evento. Sua idéia era conduzir o grupo em sua primeira experiência na rua. Porém, uma lesão na panturrilha o tirou de combate.
"Vou só assistir", lamenta. "Gostaria de arrumar ajuda para poder dar tênis e camiseta aos garotos", completa.
Os treinos são no parque Burle Marx, nas cercanias. Nos últimos dias, porém, Almeida preferiu pôr os pupilos para correr no percurso da prova. "Eles precisam se habituar."
Foi lá que conheceu e elegeu seu favorito, o vigilante Josivaldo da Silva, 40. "Ele fez uma volta de 2 km no percurso de 4 km em pouco mais de sete minutos. Acredito que ele fará a prova em uns 12 minutos."


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