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JOSÉ GERALDO COUTO
A volta dos que não foram
Como Marcos e Marcelinho, Edmundo hesita entre jogar
a toalha e seguir fazendo
o que ainda sabe fazer
AS GRANDES emoções da semana -vitórias dramáticas do
Corinthians e do Sport na Copa do Brasil, empate heróico do Fluminense em Buenos Aires- eclipsaram um fato não menos notável.
Jogando pelo modesto Santo André, contra o modesto Avaí, no modesto estádio da Ressacada, em Florianópolis, o nada modesto Marcelinho Carioca marcou o gol de número 500 de sua instável carreira.
Não são os mil e tantos de Pelé,
nem os contestados mil de Romário,
mas 500 gols, para um jogador de
meio-campo, são um feito e tanto.
Não vou discorrer aqui sobre o futebol de Marcelinho, do qual sou
grande admirador, muito menos sobre sua controvertida figura, mas
apenas lembrar que, alguns meses
atrás, o jogador tinha pendurado as
chuteiras e atuava como sofrível comentarista numa emissora de TV.
Como o pistoleiro que pega a arma
enferrujada para uma última missão
(ecos da coluna de ontem do Xico
Sá), Marcelinho voltou aos campos
esburacados da Série B por uma sobrevida, um punhado de dólares,
uma pequena glória.
Aqui entra um flashback. No dia 4
de maio, o Palmeiras acaba de golear
a Ponte Preta na final do Paulistão.
Ainda em campo, Marcos, em lágrimas, diz que meses antes já se dava por acabado. "Estava me preparando para jogar no showbol." Agora
o goleirão já sonha em enfrentar o
arqui-rival Corinthians na Libertadores do ano que vem.
Voltemos ao presente. Edmundo,
após perder seu pênalti em mais
uma decisão (a semifinal da Copa do
Brasil, contra o Sport), raspa a cabeça e diz que não joga mais. O "capo"
Eurico Miranda, no seu habitual estilo mandonista, proíbe o atleta de se
aposentar. Edmundo agora vacila.
Outro flashback: em 2005, após
um tempo parado e esquecido, Edmundo assina contrato com o mais
que modesto Nova Iguaçu, da segunda divisão fluminense. Era, todos diziam, o final melancólico da
carreira brilhante e conturbada.
Mas o anúncio da morte do Animal foi prematuro. Como autêntica
fera ferida, ele voltou ainda mais feroz. Depois de uma excelente temporada num clube médio, o Figueirense, Edmundo brilhou de novo no
Palmeiras e no Vasco, os times com
os quais mais se identificou ao longo
da sua trôpega errância.
Agora o craque vive momento de
impasse: encerra a carreira jogando
um último Brasileirão pelo time onde começou? Vai em busca de petrodólares num clube árabe? Ou simplesmente se aposenta, aos 37 anos,
mas em plena forma física e técnica?
O que esses três jogadores tão diferentes (Marcelinho, Marcos e Edmundo) têm em comum, além do
enorme talento, é a oscilação, tremendamente humana, entre o cansaço, a vontade de jogar a toalha, e o
desejo de seguir em frente, de continuar fazendo o que vieram ao mundo para fazer, de deixar uma marca
bonita na memória dos homens.
Esse momento de decisão ocorre
certamente com a maioria dos indivíduos, em qualquer ramo de atividade. Mas entre os profissionais do
futebol a dúvida íntima ganha contornos dramáticos, primeiro porque
atinge o sujeito quando ele nem tem
40 anos, está "nel mezzo del camin
di nostra vita". Segundo, porque todos os holofotes estão apontados para esses olhos úmidos que vacilam.
jgcouto@uol.com.br
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