São Paulo, sábado, 31 de julho de 2004

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FUTEBOL

Ou isto ou aquilo

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

A coluna de hoje é uma homenagem ao leitor que me chamou de "vaselina" por conta do meu comentário de segunda-feira sobre a campanha brasileira na Copa América.
É sério. É que a crítica dele, por mais mal-educada que fosse, me fez pensar em como a maior parte dos torcedores, no Brasil, gosta das afirmações peremptórias, definitivas, que não deixam margem a dúvidas ou questionamentos. Quanto mais extremo o julgamento, melhor. Fulano é um craque, Beltrano é um cabeça-de-bagre, o melhor time do país é tal. E não tem conversa. Deveria ser motivo de estudos aprofundados essa nossa dificuldade (pois não me excluo de nada) de lidar com tudo o que é contraditório, complexo, ambivalente.
Milênios de cultura judaico-cristã, reforçados por um século de cinema americano e quatro décadas de telenovelas nacionais, nos tornaram arraigadamente maniqueístas.
O sujeito é "do bem" ou é "do mal". Preto ou branco. Isto ou aquilo. E não tem conversa.
O problema é que as pessoas não são assim tão definidas e unidimensionais, a vida não é assim tão nítida. É isto e aquilo, juntos, todo o tempo.
Querem um exemplo singelo? Romário. Para uns, ele ainda é único, imprescindível; para outros, está acabado, é um peso morto para o seu time.
Quem viu Fluminense 2 x 0 Corinthians, sábado passado, sabe que ele pode ser as duas coisas numa mesma partida.
No primeiro tempo, Romário quase não tocou na bola, mas, na única vez que ela lhe chegou mais ou menos redonda, pelo alto, ele fez um gol de cabeça da entrada da área, encobrindo Fábio Costa com sutileza e precisão. O comentário geral, depois do gol: "Romário é o craque que decide".
Mas veio o segundo tempo, e só o Corinthians atacava. O Fluminense não passava do meio-de-campo. Romário se arrastava como se fosse um aposentado de bermuda e chinelo. Seus companheiros se esfalfavam em vão.
Pois bem. Foi só o técnico Ricardo Gomes sacar o atacante, trocando-o pelo jovem e bem disposto Alan, para que o Fluminense começasse a sair de seu campo e criasse várias chances de gol.
O que dizer então de Romário? Como engavetá-lo numa breve definição, como atribuir-lhe uma nota? Ele é o craque que decide ou um peso morto? As duas coisas. Isto e aquilo, ao mesmo tempo.
Tomemos outro exemplo, outro personagem que divide opiniões: Galvão Bueno, que aliás foi alvo de comentários certeiros dos colegas Marcos Augusto e Soninha.
Galvão é chato, autoritário, manipulador, patrioteiro, dono da verdade. Mas é também, em termos técnicos, um dos melhores locutores do país. Sabe tudo de seu ofício, tem "timing", modulação de voz, presença de espírito, humor e vibração. É isto e aquilo.
Por essas e por outras, desconfie quando alguém (comentarista, colega de trabalho, companheiro de mesa de bar) chegar dizendo que tal coisa é tal coisa e não tem conversa. Sempre tem conversa.

Dois destinos
Quando Santos e Cruzeiro permutaram seus técnicos, meses atrás, muito se especulou sobre quem sairia ganhando, Emerson Leão ou Vanderlei Luxemburgo. Hoje não há mais dúvida. Leão se desgastou com o declínio do Cruzeiro (pelo qual teve pouca responsabilidade), e Luxemburgo tem grandes chances de se tornar de novo campeão brasileiro.

Lance arriscado
Fala-se numa possível volta do volante Vampeta ao Corinthians. Pelo histórico recente do jogador, teria tudo para ser uma repetição do fiasco do colombiano Rincón.

Repouso do guerreiro
Valdo, 40, pára no fim do ano. Está aí um jogador que soube dignificar o seu ofício.

E-mail jgcouto@uol.com.br


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